Quando a Bitget entrevistou 2.302 usuários ativos entre 7 e 11 de abril, os dados recompilados colocou o Brasil numa prateleira própria em toda a América Latina. Nada menos que 33% dos respondentes declararam ter perfil de risco “arrojado”, e 27,8% já concentram mais da metade da carteira em criptoativos.
Proporções que despencam para 12,8% e 25,1%, respectivamente, nos demais países analisados (Argentina, México, Colômbia e Chile). Ou seja, para cada investidor latino que mergulha fundo no mercado cripto, há quase três brasileiros dispostos a fazer o mesmo.
O dado reforça uma tendência já apontada pela Receita Federal, que informou que 4,9 milhões de CPFs declararam posições em cripto, volume próximo dos 5,3 milhões de contas de pessoas físicas na B3, levando a própria Bitget a projetar que os cripto-investidores superariam os acionistas tradicionais antes do fim de 2025.
Fatores culturais e econômicos
Uma peça importante do quebra-cabeça é a digitalização bancária agressiva. Uma pesquisa da Febraban publicada esse ano mostra que 82% das transações bancárias já acontecem em canais digitais, e três em cada quatro operações ocorrem diretamente no celular. O Pix, por exemplo, saltou para 76,4% de adoção populacional.
Ele supera o dinheiro e os cartões como meio de pagamento preferido. Esse conforto em mover dinheiro pelo smartphone derruba barreiras de entrada. Abrir conta em uma exchange ou trocar reais por stablecoins está se tornando tão trivial quanto pagar um cafezinho.
Há também uma motivação macroeconômica. Inflação de dois dígitos em boa parte da última década e Selic ainda acima de países vizinhos empurraram poupadores para ativos que prometem retornos superiores aos da renda fixa clássica com os vistos nas melhores exchanges do país.
Para completar, golpes cambiais de moedas locais, peso argentino ou peso colombiano, servem como lembrete regional de que o real, apesar de volátil, encontra no Bitcoin e em stablecoins lastreadas em dólar uma rota de proteção.
Perfil etário e consumo de informação
Outro detalhe curioso da pesquisa Bitget é etário, pois 55,6% dos cripto-investidores brasileiros têm mais de 45 anos, enquanto a média latino-americana fica em 43,9%. Não se trata, portanto, de um clube de adolescentes na internet, mas de um contingente com maior patrimônio acumulado e vivência de mercado.
Essa maturidade se reflete na estratégia, onde 44,4% combinam trading de curto prazo com holding de longo prazo, acima dos 39,6% da região. Quando se trata de informação, porém, o mesmo grupo mostra leve rebeldia, pois um terço (33%) confia nas redes sociais como principal fonte, deixando a mídia especializada em segundo plano, com 22%.
Os números revelam ainda que o brasileiro não quer ficar preso a um único estilo de operação. Entre janeiro e setembro de 2024, os contribuintes informaram R$247,8 bilhões em transações com criptomoedas, alta de 24% sobre o ano anterior, segundo dados oficiais da Receita.
Parte desse giro vem de traders diários em busca de oportunidades de curto prazo, outra parte permanece em “hold”, estratégia que defende manter os tokens por ciclos completos de mercado. A pesquisa da Bitget já apontara que 44,4% dos investidores combinam as duas abordagens.
Na prática, isso se traduz em uma carteira onde 60% fica em blue-chips (BTC/ETH), 20% em projetos de alto desempenho, 10% em stablecoins para rebalanceamento rápido e até 10% em memecoins, estes últimos responsáveis por colocar o Brasil como único país latino-americano com dois dígitos de preferência por esse tipo de ativo.
Legislação cripto brasileira e os planos para o futuro do mercado
O primeiro passo para transformar ímpeto em resultado é escolher bem a porta de entrada. No Brasil, o marco regulatório chegou com a Lei 14.478/2022, derivada do PL 4401/21, que deu ao Banco Central poderes para autorizar e fiscalizar prestadoras de serviço de ativos virtuais, exigindo segregação de patrimônio, regras de liquidez e registros antifraude.
Depois da lei, várias corretoras reforçaram controles de custódia e obtiveram certificados ISO-27001. Mas, embora o perfil arrojado rende headlines, ele não sobrevive sem disciplina. Depois da lei, plataformas de troca passaram a oferecer ordens OCO (One Cancels the Other) e limites automáticos de perda.
O Fisco também deve entrar no cálculo, já que ganhos superiores a R$35 mil no mês têm tributação progressiva, cenário que torna indispensável reservar parte dos lucros em moedas digitais estáveis para futuros DARFs.
Além disso, o Banco Central encerrou em fevereiro de 2025 a primeira fase do Piloto Drex, avaliando privacidade, segurança e interoperabilidade da futura moeda digital brasileira. O relatório identificou avanços, mas também questões complicadas para equilibrar descentralização e proteção de dados antes do lançamento definitivo em 2026.
Para os investidores, a chegada do Drex significa liquidação instantânea entre reais tokenizados e criptoativos, redução de custos de arbitragem e novas possibilidades de renda fixa tokenizada. Já as corretoras precisarão se adequar, se não estiver em dia com os requisitos de capital e os sistemas antifraude pode ficar impedida de operar pares Drex-cripto.