Por Gabriel Andrade
O basquete moderno passa por um processo chamado de Positionless, em que as posições tradicionais como armador, ala-armador, ala, ala-pivô e pivô não importam tanto assim, jogadores podem cumprir diferentes funções em quadra que, a princípio, não são atribuídas à posição em que joga.
Esquemas táticos flexíveis quebram a ideia de que precise o tempo todo do chamado “armador puro” ou um “pivô dominante no poste baixo”. Os times são versáteis o suficiente para proporem mais alternativas de jogo. Isso significa também que, no Positionless Basketball, os jogadores escalados precisam fazer múltiplas funções em quadra, podendo ser um Nikola Jokic armando o jogo em handoffs, jogadas de poste baixo, do cotovelo do garrafão ou mesmo puxando a bola em contra-ataque.
Pivôs podem abrir mão dos rebotes defensivos para Russell Westbrook iniciar o contra-ataque mais rápido, iniciando ele mesmo as ações. Draymond Green pode ser o centro da armação no Golden State Warriors, que forma a maior parte de seus ataques longe do pick-and-roll, explorando a gravidade e a movimentação sem a bola do trio Stephen Curry-Klay Thompson-Kevin Durant.
Os alas-pivôs tradicionais, aos poucos, vão sendo substituídos pelos combo forwards, alas altos o suficiente para marcar o garrafão, mas que são mais fluidos e flexíveis para defender o perímetro e espaçar a quadra. A distância entre um ala e um ala-armador é basicamente inexistente, enquadrados na categoria de wings. Armadores estão ficando maiores e mais atléticos a cada ano. Pivôs estão saindo do garrafão para fazer coisas no perímetro também.
O Denver Nuggets, um dos times que mais exploram esse conceito, arma as jogadas com um pivô (Jokic), possui um armador que não é bom criando jogadas para os companheiros e historicamente jogava como ala-armador (Jamal Murray), um ala flexível, arremessador e defensor versátil em Gary Harris, um combo forward alto que gosta de cortes e atacar adversários mais baixos em Wilson Chandler, além do canivete suíço Paul Millsap, outro bom passador, um ala-pivô que gosta de jogar de frente para a cesta e que defende várias posições. O sexto melhor ataque em eficiência ofensiva da NBA é formado por jogadores versáteis, um pivô único e passador e um armador que não é bom em passe.
Nesse sentido, as posições que sempre foram símbolo de versatilidade são as de ala-armador e ala, agora, wings. Entre wings e combo forwards, gosto de classificar todos apenas como alas. No basquete moderno, a maioria dos times é formado por um criador após o drible, três jogadores de movimentação sem a bola, arremesso e defesa versátil e um big man atlético que ataque o aro via pick and roll.
Existem variações disso, é claro, mas no geral são equipes focadas em tomar decisões rápidas, espaçar a quadra em todas as posições para ganhar espaço e trocar passes onde existe menos contestação inicial (no perímetro), criação após o drible para obrigar a defesa a marcar mais de perto e atravessar corta-luzes, além de capacidade atlética para receber passes por cima do aro.
Em comum, três jogadores fazem funções parecidas, embora possam ter particularidades, como alguns alas que são mais focados em se movimentarem o tempo inteiro sem a bola para arremessar, como outros que são melhores na criação secundária, seguindo a movimentação do jogo quando o criador principal (chamado de lead guard) não consegue ele mesmo finalizar a jogada. Mas, em comum, são posições de tamanho uniforme, entre 1.96m e 2.05m de altura, com a envergadura também sendo importante aqui.
Isso significa que, se é a posição que mais está sendo usada em esquemas táticos, é também as que as equipes precisam de mais profundidade, mais explorado no Draft e na Agência Livre, o que cria uma anomalia. O recrutamento, sobretudo nos últimos anos, tem revelado mais pivôs e armadores do que alas para suprir esse volume. Jogadores dessas duas posições não precisam de tanta profundidade, o que faz que talentos sejam subutilizados na NBA e que percam valor de mercado/cotação no Draft, por mais talentosos que sejam.
Nessa busca incessante, times acertam em cheio quando pegam Jaylen Browns, Jayson Tatums, Brandon Ingrams e Devin Bookers, mas podem também supervalorizar caras como Stanley Johnson, Mario Hezonja e Malik Monk, caras talentosos, mas que não estavam tão prontos assim para cumprirem suas funções ao serem selecionados. O mercado, por outro lado, vai pagar caro para manter alas eficientes como Joe Ingles, Danny Green, Gary Harris e Robert Covington. Em busca de valores mais baratos, o mercado europeu ganha força quando nomes como Darius Miller e Royce O’Neale saem por pechincha.
As equipes estão malucas por alas, profundidade nessa posição nunca é suficiente. Em um recrutamento de 2018 repleto de alas defensivos e experientes para o nível universitário, vamos fazer a ponte (atenção paro trocadilho) entre essa introdução enorme e dois dos melhores alas do basquete universitário: Mikal e Miles Bridges, que não são irmãos, muito menos parentes.
Miles Bridges | Mikal Bridges | |
País | Estados Unidos | Estados Unidos |
Clube | Michigan State | Villanova |
Idade | 20 | 21 |
Altura | 1.99 m (6’6.25’’) | 1.98 m (6’6’’) |
Envergadura | 2.01 m (6’7’’) | 2.15 m (7’0.5’’) |
Peso | 104 kg (229 lbs) | 95 kg (209 lbs) |
Posição Listada | Ala/Ala-Pivô | Ala/Ala-Pivô |
Estereótipo Posicional | Two-Way Playmaker | Ala 3-and-D de Versatilidade Defensiva |
Habilidades Posicionais | Criação de Arremesso/Drible, Post Up/Isolação, Passe, Chute e Defesa | Arremesso de Três Pontos Fora da Bola e Cortes, Defesa de Elite das Posições 1-4 |
Jogadores na NBA dentro da Categoria | Paul Millsap, Boris Diaw, Dragan Bender, Aaron Gordon e Draymond Green | Robert Covington, Trevor Ariza, Taurean Prince, DeMarre Carroll, Jae Crowder e Al-Farouq Aminu |
Estatísticas em 2017/18
Miles Bridges: 17.1 pontos, 7.0 rebotes, 2.7 assistências, 2.0 desperdícios de bola, 0.6 roubos de bola, 0.8 tocos, 45.7% nos arremessos de quadra, 36.4% arremessos de três pontos e 85.3% nos lances livres, em 31.4 minutos.
Mikal Bridges: 17.7 pontos, 5.3 rebotes, 1.9 assistências, 1.4 desperdícios de bola, 1.5 roubos de bola, 1.1 tocos, 51.4% nos arremessos de quadra, 43.5% arremessos de três pontos e 85.1% nos lances livres, em 32.2 minutos.
Miles Bridges
Surpreendentemente ficando um ano a mais no NCAA depois de ser cotado como quase certo no TOP 10 do Draft no ano passado, Miles Bridges é um ala do estilo faz tudo, um atleta versátil, muito atlético e que joga maior que sua altura/envergadura por conta de sua força, fisicalidade e explosão em dois pés. Em relação ao seu primeiro ano no College, não demonstrou muitas evoluções nos aspectos que mais lhe faltam, nominalmente criação após o drible, versatilidade do arremesso e controle de bola, saindo basicamente o mesmo jogador do que foi cotado no ano anterior, com a diferença de ter jogado mais como ala do que ala-pivô desta vez, o que mostrou fraquezas maiores suas como jogador de perímetro.
Em uma NBA que joga mais cada vez mais em small ball, Miles causa impacto como um jogador explosivo sem a bola, usando de sua explosão, primeiro passo e capacidade de salto para punir jogadores mais lentos/menos atléticos em infiltrações, cortes sem a bola em mãos e jogadas de pick and roll secundário. Jogando contra ala-pivôs, sua falta de drible é menos exposta, assim como a vantagem física fica mais clara contra jogadores de garrafão, geralmente menos ágeis lateralmente. Ótimo atleta de transição que joga na máxima velocidade.
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Apesar de não ser um passador avançado e tomar decisões ruins com a bola em mãos, é capaz de fazer boas leituras de passe como esta. Miles vê o caminho para o garrafão fechado por três jogadores e ajuda defensiva, mas consegue completar um bonito passe para a zona morta.
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Como arremessador, possui capacidade para arremessar parado e alguns flashes de que pode chutar após o drible ou em movimento, mas no geral a mecânica alta e compacta pode ficar lenta e sem balanço. Desconfortável quando precisa dar um ou dois dribles ou está mais contestado.
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Não exibe muito potencial criando as próprias oportunidades. Controle de bola rígido em tráfego, não possui fluidez suficiente para jogar em um pé só. Não tem envergadura suficiente para estender finalizações ao redor do aro.
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Na defesa, é forte o suficiente para marcar jogadores mais altos, além de ter pés ágeis para trocar marcação contra armadores e ala-armadores. Nesse aspecto, pode trazer versatilidade interessantíssima, muito flexível na retaguarda.
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Mikal Bridges
Bicampeão universitário por Villanova, Mikal Bridges é quase o protótipo perfeito de 3-and-D, super longo, atlético, versátil em seu chute (parado, em movimento ou após um ou dois dribles), ótimo finalizador ao redor do aro com cortes oportunos, capaz de proteger o aro como defensor do lado contrário e defender quatro posições. E como jogador desse tipo, cria pouco, controla pouco a bola e raramente vai ser visto driblando, um atleta complementar que se encaixa em quase todo esquema tático.
Na defesa, foi criado em um ótimo sistema. Possui boas leituras dentro do jogo de um modo geral. Pés ágeis, usa seu corpo forte para controlar espaços e recupera terreno em jogadas agressivas com a envergadura.
O que vai ditar seu jogo ofensivo será a tradução de seu arremesso. Se for capaz de acertar chutes em movimento como este, será o tipo mais valioso de arremessador, que obriga a defesa a tomar posições por conta do perigo constante sem bola.
https://streamable.com/uxax9
Entretanto, não possui controle de bola, visão de jogo e destreza para criar arremessos em volume. Difícil que vá ser mais do que uma quarta ou quinta opção ofensiva dentro da NBA.
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Conclusão
Enquanto Miles possui um estilo mais agressivo em transição, recebedor de ponte-aéreas e slasher, Mikal é mais focado em seu chute de três pontos, cortes após receber um passe. Em comum, ambos são jogadores versáteis na defesa, com o segundo ligeiramente mais longo, e que se encaixam em basicamente qualquer esquema tático, apesar de serem limitados como poderosas armas ofensivas, o que não quer dizer que vão desenvolver. Nem todo ala ofensivo vai virar Jimmy Butler ou Kawhi Leonard. Maneirar as expectativas teria ajudado em relação a Justise Winslow e Stanley Jonhson. Na liga dos alas, não se espantem se os Bridges aparecerem lá em cima, do TOP 10 ou até mais do que isso.