O Lado B

Projeto Aurora, em Recife, é interrompido por fiscais

Fonte: Projeto Aurora, em Recife, é interrompido por fiscais

Como as coisas são injustas, não? Em poucos dias, o Brasil vai sediar o maior evento esportivo do mundo e sofremos com o pouco ou quase nenhum incentivo governamental para que a base comece a praticar o esporte, seja lá qual for. Sim, até existem prefeituras, estados, que tentam priorizar esse tipo de ação, mas sabemos como o Brasil infelizmente é. Até chegar ao interessado, esse dinheiro passou por várias mãos e sofreu alterações de valores. No país da corrupção, quem tenta fazer o bem é o culpado. E foi o que aconteceu em Recife, na semana passada.

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João Paulo Farias é um publicitário, que teve no último dia 14 uma surpresa nada agradável. Ele, idealizador do Projeto Aurora, que incentiva a prática de basquete a algumas crianças, tirando-as das ruas e dando a elas a socialização e até mesmo, educação, foi surpreendido por duas funcionárias do CREF, de Pernambuco. Até a presença da polícia foi solicitada. Agora, vejam bem a causa disso: burocracia.

O projeto precisou ser interrompido pela falta de documentação. Sim, João Paulo não é professor de Educação Física. Ele “apenas” tirou dinheiro do próprio bolso, comprou bolas, redes, aros, e montou um grupo para que crianças e adolescentes praticassem basquete. E sim, de graça. Mas, por não ser professor, ele jamais poderia fazer isso, pois não é “habilitado”.

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Justo.

Eu comecei a fazer o curso de Educação Física, lá no fim dos anos 90 e tive muito orgulho de estar ali, pois sabia que era algo produtivo e que eu realmente gostava. No entanto, as coisas não são exatamente como imaginamos e acabei seguindo caminho diferente. Porém, por ter feito parte disso, por ter visto o que se deve fazer e o que não deve, eu acho que houve um pouco de excesso. Não da parte de João Paulo, que quis mesmo dar um pouco de alegria aos jovens. Mas pelo órgão responsável por ser chato. Aliás, é obrigação ser chato, pois eu acho mesmo que precisa coordenar, que precisa estabelecer parâmetros, direcionar e fiscalizar. Mas só. Notificar e depois jogar para a torcida, sinceramente, só mostra o quão estamos despreparados.

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Sim, é necessário ir atrás, tentar orientar alguém que esteja realizando um projeto desse tipo. Mas impedir a prática esportiva? Ah, é revoltante. É um ultraje ao esporte. O Dois Por Cento também se sensibilizou e publicou o vídeo abaixo.

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O Jumper Brasil obteve um áudio de uma dessas funcionárias públicas, que, segundo relatos de pessoas próximas ao local, ela mente ao dizer que João Paulo incentivou seus alunos a proferirem palavrões e que ele elas foram ameaçadas fisicamente. No áudio, a mulher diz: “Isso é um projeto social de fato, orientado por um leigo, o cara é publicitário e pastor de uma igreja e resolveu orientar aula de basquete. Ele, de fato, foi notificado pelo exercício ilegal de profissão. Eu não penalizo profissional, porque são meus colegas de profissão e todo mundo sabe da minha conduta”.

Ela continua: “Chamei apoio policial porque minha integridade física estava sob ameaça. Chamei também porque o senhor João não queria informar seus dados para ser notificado. Depois de esclarecidos os fatos, vocês e os demais profissionais de educação física, que são meus colegas de profissão e para quem eu trabalho, aplaudam a nossa atuação”.

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Não tenho a menor necessidade de citar o nome da profissional, mas quem já ouviu o áudio na íntegra, sabe que ela pediu para compartilhar e divulgar. Então estou fazendo.

Saiba que eu sempre aplaudi de pé quem se importa com o esporte, quem tem zelo com as crianças e que até entendo sua posição. É sua obrigação, sim. Mas realmente é necessário? Indicar profissionais interessados no trabalho voluntário seria o mais legal de tudo e jamais estaríamos escrevendo sobre esse assunto no Jumper, que é especializado em NBA, basquete Mundial e Olímpico. Ou seja, moça, você ganhou seus segundos de fama com a autuação e com o áudio no Whatsapp, mas o esporte falou mais alto. O desejo de fazer o basquete crescer e de tirar as crianças das ruas, mais ainda. Quem ganhou foi o basquete e o Projeto Aurora.

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Segundo o site do Diário de Pernambuco, o Basquete Solidário vai voltar à Rua da Aurora. O jornal entrevistou a advogada de João Paulo, Fabiana Nunes, que explica a ação de seu cliente:

“Ele não agiu de má fé. Pelo contrário, estava li para promover o bem. Além disso, não se trata de um treino para criar atletas de basquete. De toda forma, a rigor, é importante que tenha um profissional de educação física no espaço. O Conselho Regional permite a atuação voluntária”.

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Em nota nas redes sociais, o Conselho Regional de Educação Física informou ter agido com cuidado à saúde das crianças.

“Durante a visita da equipe de fiscalização do CREF12/PE-AL acontecia um treinamento de basquetebol, com o ensino de tipos de passe e condução da bola, para aproximadamente 22 crianças e adolescentes, com faixa etária aproximada de 8 a 18 anos, orientadas por pessoa não habilitada ao exercício da Educação Física. Como visto, o projeto atende à crianças e jovens de diversas faixas etárias, que estão em diferentes fases do desenvolvimento infantil. Essas diferentes fases, compreendem diferentes condições físicas, motoras, cognitivas e psíquicas, que exigem diferentes cuidados quanto à pratica esportiva. Dessa forma, o treinamento aplicado à uma criança de 8 anos nunca deve seguir os mesmos princípios, como intensidade, sobrecarga e volume, do treino voltado para o adolescente. Esse tipo de prática certamente trará prejuízos diversos às crianças, principalmente àquelas que estão nas fases iniciais do desenvolvimento. Apenas o Profissional de Educação Física está habilitado para orientar treinamento esportivo, nesse caso, do basquetebol, desde a iniciação esportiva ao alto rendimento e é o único capaz de aplicar a prática esportiva considerando a individualidade de cada criança sem detrimentos ao seu desenvolvimento integral, como traz a Lei 9696/1998, que regulamenta a Profissão de Educação Física”.

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Podemos sonhar com alguma medalha no futuro se o pensamento for esse? Podemos acreditar que a iniciativa privada vai acreditar em projetos solidários ou até mesmo profissionais? Difícil é pensar que nossos governantes farão algo. Aliás, estamos em ano político. De repente, algum papagaio de pirata vai tentar se promover, né? Nunca se sabe.

Tudo bem, como escrevi acima, eu entendo a autoridade e sua necessidade de fazer a lei ser respeitada. O que eu não entendo é como isso não foi resolvido de uma forma mais sadia e amistosa daqueles que querem “canetar”. Jogar a responsabilidade toda para o João Paulo? Muito fácil.

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Sim, respeito a profissão. Acho uma das mais encantadoras. Mas nunca vai passar pela minha cabeça a suspensão de um projeto tão digno por conta de um papel. Não tem como. Se tivessem dado um prazo, seria louvável. Mas não. Quiseram interromper.

Conseguiram, por pouco tempo.

O basquete respira. Por aparelhos, mas está vivo.

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