“Hand Check” mudou tudo na NBA

Gustavo Freitas analisa como o jogo mudou nas últimas décadas por conta da marcação

Fonte: Gustavo Freitas analisa como o jogo mudou nas últimas décadas por conta da marcação

“Hand Check”. Você já deve ter ouvido esse termo em algum momento, mas talvez não saiba exatamente sua definição e o que causou na NBA depois de sua proibição. Para quem não sabe o que significa, a gente resolveu mostrar, com vídeos, o real poder que isso tinha na marcação.

Mas antes, vamos entender.

O termo “hand check” é, nada mais, nada menos, que um defensor poder utilizar as mãos em cima de seu oponente. Bem, na verdade, era. Isso porque a liga resolveu abolir, em definitivo, em 2004.

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Até então, o marcador poderia usar as mãos para definir para onde levaria o adversário. Se ele quisesse fechar um ângulo e forçar aquele jogador a arremessar do lado do garrafão, era permitido. Era permitido tocar nas mãos, braços, pulsos e pernas. O que acontecia era um contato muito mais intenso do que na atualidade. Hoje, se você tocar, a arbitragem marca falta imediatamente.

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Neste vídeo, em inglês, Kenny Smith, ex-jogador da NBA, mostra como a marcação mudou e ficou mais permissiva. Quando ele pede para que o rapaz o marque como antigamente, ele eventualmente sairia para o garrafão e encontraria um pivô nos moldes de Shaquille O’Neal.

A liga mudou drasticamente com essa alteração nas regras. Desde então, times procuraram no draft jogadores cada vez mais rápidos e fortes, apostando na cobertura de espaços. Obviamente, sem usar as mãos, o desafio aumentou. Com a massificação do small ball, as equipes perceberam que a melhor defesa era o ataque. Nas condições atuais, jogadores estão utilizando cada vez menos tempo de posse de bola para definir uma jogada, muito pela qualidade dessa geração.

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Em contrapartida, os garrafões ficaram extremamente vulneráveis. Várias equipes atuam, por alguns minutos, sem um pivô de ofício. Mas é bom lembrar que o small ball não começou em 2015. Don Nelson, então técnico do Golden State Warriors, optou por utilizar um ala-armador, Corey Maggette, como ala-pivô, forçando mismatches. Um jogador com maior velocidade e capacidade de arremessar força o treinador oponente a fazer ajustes defensivos. Como um ala-pivô, de 2,08m e 115 quilos vai marcar um ala-armador de 1,98m e 85 quilos? E quando acontecia o contrário, as dobras apareciam e esse ala-pivô era quase inútil dentro da quadra em determinados momentos.

Em um primeiro momento, treinadores mantinham o quatro (ala-pivô) mais técnico jogando mesmo assim. Mas sem poder utilizar as mãos, esse jogador era facilmente batido na velocidade. O oponente não se arriscava dentro do garrafão e, dentre outros fatores, os arremessos de longa distância começaram a crescer.

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O pensamento mais lógico, então, foi buscar alguém da altura desse ala-armador e com capacidade de cobrir espaços. Mas a qualidade do arremesso dos atuais jogadores aumentou em grande proporção. Atualmente, é “normal” um atleta arremessar pouco depois do meio da quadra para pegar o adversário de surpresa. Astros como Stephen Curry e Trae Young são os melhores exemplos disso.

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Aqui, marcadores ficam distantes, imaginando que Young até pode realizar o arremesso, mas a qualidade que ele possui proporciona a tentativa de longe. Não houve tempo para o defensor pensar em alternativa. Às vezes, um drible e o chute.

Sem usar as mãos, ficou mais difícil um defensor alterar o pensamento do arremessador. Antes, aquele que atacava, pensava no drible, na marcação dupla e, então, procuraria uma forma menos complicada de definir o lance. Hoje, ele acerta o chute com um ou dois metros de distância de seu marcador para não ter que mudar seu pensamento. Ele já sai de sua quadra defensiva para o ataque sabendo o que vai fazer. E faz.

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Claro. Isso não é regra. Não é toda vez que isso acontece. Essas coberturas ficaram maiores ainda com a permissão da marcação por zona. Antes, era completamente individual. Foi uma forma que a NBA encontrou para evitar placares com 350 pontos (somando os dois times). Mas, ainda assim, times procuraram meios de pontuar em grandes proporções. Hoje, o jogo está focado nos ataques, nos erros individuais e coletivos do oponente para que abram vantagens.

Legado

O small ball ganhou ainda mais força quando o Houston Rockets, do técnico Mike D’Antoni, resolveu  abrir mão do pivô em definitivo, tanto que trocou um dos melhores da posição na atualidade para o Atlanta Hawks, Clint Capela, por Robert Covington, um bom defensor de perímetro, Jordan Bell (que virou Bruno Caboclo e troca de escolhas no draft) e pick de segunda rodada. Lesionado, Capela já não estava jogando, o que fez D’Antoni experimentar algo novo.

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O que aconteceu? O Rockets venceu dez partidas em 12 disputadas, sendo seis de forma consecutiva. Estava imparável. Ganhou do Charlotte Hornets por 15 pontos. No jogo seguinte, foi a vez do Los Angeles Lakers, em Los Angeles, perder por dez. Superou o Boston Celtics e Utah Jazz, bons times defensivos, também por mais de dez pontos. Atropelou Memphis Grizzlies e Warriors por 28 e 30 pontos, respectivamente, bateu o frágil New York Knicks, também acima de dígito duplo.

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Em determinado momento, é possível ver Russell Westbrook passando sozinho pelo garrafão para uma enterrada. Depois, ele é marcado por Rajon Rondo na área pintada. Veja que não tem ninguém por ali. Perceba que em boa parte dos arremessos não existe pressão ou qualquer tipo de marcação mais forte.

Só que os adversários entenderam a forma de o Rockets jogar. O Celtics perdeu por um ponto na sexta vitória seguida do time texano, enquanto o Knicks venceu por dois. Sim, o Knicks. A franquia de Houston ainda sofreu derrotas na sequência e preocupantes para o Orlando Magic (por 20 pontos), Los Angeles Clippers (por 15), Hornets, que havia enfrentado antes, por nove, evidenciando a fragilidade do esquema.

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Mas isso, eventualmente, vai dar certo. Isso vai funcionar. D’Antoni ficou famoso por fazer o Phoenix Suns jogar nessa “bagunça organizada”. Tudo bem que o Suns não foi campeão, mas Steve Nash ganhou dois prêmios de MVP em anos consecutivos. E quando foi isso? Assim que o “hand check” foi proibido. Pode não dar certo agora. Pode levar mais alguns anos, porém D’Antoni, por mais criticado que seja, consegue tendências na liga.

A ausência cada vez maior de pivôs, sem que ninguém possa encostar no marcador, o aumento do arremesso de três, os garrafões esvaziados, são legados que a falta do “hand check” trouxe.

Há quem defenda o estilo de jogo atual. Para o mercado, é óbvio que isso é favorável. A TV, que cada dia paga mais, quer ver seus números crescendo. A NBA, que oferece o produto, vende ainda mais caro quando eleva nomes ao estrelato. Mas para o estudo do jogo, tudo ficou mais simples na visão da maioria. Basicamente, é chegar e arremessar. É óbvio que isso é um exagero, assim como é o número de arremessos de três.

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Comparações

Nós, seres humanos, comparamos tudo, ainda que não seja de forma justa. Nas últimas semanas, logo após o primeiro episódio de “The Last Dance”, que mostra os bastidores do último título do Chicago Bulls, em 1998, essas primeiras comparações surgiram para saber o que Michael Jordan faria nos tempos atuais.

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São vários debates, muita coisa dita em cima de algo que aconteceu há 22 anos, mas estamos falando de um dos maiores (ou o maior) jogador de todos os tempos.

Na época, a internet estava dando apenas os seus primeiros passos. O que era dito naqueles anos pela TV era quase que um mantra. As opiniões contrárias aconteciam em bate-papos particulares, sem que houvesse uma conversa em massa, como nas redes sociais. Hoje, o contraponto está muito mais exposto, muito mais difundido.

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A marcação era muito mais intensa. Jordan tinha de alterar o seu arremesso depois de saltar em diversas oportunidades. Marcações duplas no perímetro, às vezes tripla no garrafão. O grau de dificuldade era bem maior. Quantas faltas seriam marcadas hoje, sempre com “hand check”? Jordan mostra vários fundamentos neste vídeo, arremessando após o drible, após mudar de direção mais que uma vez, da base da tabela, do topo, após o post… inúmeras formas de pontuar

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Com esse “boom” do documentário, analistas e jornalistas estão sendo saudosistas, mas todos perceberam as diferenças do jogo daquela época para o atual. A quarentena, por conta do COVID-19, aumenta ainda mais o sentimento de que não há assunto a ser tratado no basquete, com exceção ao “The Last Dance”.

Em uma dessas comparações, Jalen Rose, da ESPN, afirmou que Jordan alcançaria 47.5 pontos de média, ainda abaixo dos 50 pontos que David Falk, agente do ex-jogador, sugeriu.

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Claro que são números inimagináveis. Ninguém pensa em algo parecido hoje. É surreal.

Por mais que Jordan tenha obtido 37.1 pontos em 1986-87, quase ninguém acredita que algo muito acima disso seria possível.

Bem, talvez não chegaria a 47.5 pontos, mas sabendo como ele jogava, como a NBA é hoje, abrindo tantos espaços no garrafão e a ausência do hand check, o imaginário não deixa de existir.

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