Jogar basquete no Brasil não é uma tarefa tão simples, mas quem gosta dá um jeito. Afinal, aqui é o país do futebol. Seja de campo, areia, salão, o futebol domina por aqui. Até aí, tudo normal. Mas e quando você, ainda no colégio, descobre um outro esporte e se apaixona?
Aí é o ponto do artigo de hoje: não tem idade para começar (ou voltar) a jogar.
Eu jogo basquete desde os nove anos, quando vi o Brasil vencer os Estados Unidos no Pan de 1987. Faça as contas. Improvisei um aro no quintal de casa e comecei a arremessar. Na época, eu ainda jogava futebol, aquele zagueiro grosso que sabia cabecear e chutar de longe. Mas ao ver Oscar Schmidt, Marcel, Mauri, Pipoka, entre outros grandes nomes do esporte no país, tive vontade de aprender.
Mas faltava o interesse de meus colegas do bairro ou do colégio. Eu lia o jornal pela manhã para descobrir os resultados dos jogos da NBA, mas não da noite anterior. Era de dois dias antes. Ainda assim, até aquela época, eu não tinha visto nenhuma partida da liga.
No entanto, ficava muito feliz ao ver que a Band transmitia o Campeonato Paulista de Basquete e aquilo me dava ainda mais vontade de jogar. Seja no masculino ou feminino, não perdia uma partida.
Então, um dia meu pai me levou na casa de um amigo, que assistia um jogo da NBA. Isso, dois anos depois. Era o sinal da ESPN Internacional e, do nada era um Boston Celtics x Los Angeles Lakers. Meu pai queria ir embora, mas teve de esperar o fim da partida.
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A parte mais legal daquilo é que eu sabia os nomes dos jogadores, falava sobre como eles jogavam, pois já havia lido na Folha de São Paulo. Enquanto minha curiosidade sobre o basquete crescia, eu comprava revistas dos EUA sobre o assunto.
Saindo de lá, meu pai me perguntou se eu realmente sabia. Chegamos em casa e mostrei a coleção de cards e revistas que comprava com a mesada.
Então, em 1991, já com 13 anos, mudei de colégio. Lá, havia um professor que gostava muito de basquete e me deixava jogar sozinho enquanto outros alunos estavam no futebol. Parecia um ET. Até que um dia, outros três meninos perguntaram se poderíamos fazer duplas.
Até então, eu jamais havia jogado com alguém. Na semana seguinte, eles chamaram mais dois. Fizemos trios. Em um mês, éramos dez e jogávamos com a quadra inteira. Do nada, eu saí de 1,70m e fui para 1,81m. Comecei a jogar de pivô, enquanto o professor começou a fazer treinamentos mais sérios. Ele conseguiu montar um grupo com 20 garotos e em outro horário.
Começamos a treinar duas vezes por semana e era quase como um sonho se realizando.
Sabe aquele moleque que tem vontade de ser jogador de futebol? Então, eu tinha isso, mas com basquete.
Ganhei um teste no Palmeiras (apesar de morar em Uberaba-MG) e passei. Entretanto, minha mãe, que já havia vetado aquele zagueiro caneludo de disputar um campeonato de futebol por dar um carrinho em um primo, vetou de novo.
Dream Team
Eu já acompanhava jogos da NBA há alguns anos, então veio o Dream Team. E era tão louco, pois ali estavam Magic Johnson, Larry Bird e Michael Jordan. Os dois caras daquele primeiro jogo que vi em 1989 e um outro que estava batendo os outros em finais.
Naquele época, eu tinha um Mega Drive e, nas locadoras, alugava os jogos Bulls x Lakers e o do Dream Team. Passava os finais de semana jogando em quadra e no video game, enquanto esperava as partidas da NBA mais tarde.
Então, quando vi o Dream Team, só tinha uma certeza: eu ia fazer algo sobre basquete na vida. Não sabia se seria jogador, narrador (eu fingia ser Galvão Bueno narrando corridas do Ayrton Senna) ou se seria jornalista para cobrir os jogos.
Enquanto a primeira opção ia ficando cada vez mais distante, comecei a pensar seriamente sobre as outras duas.
Treinando em clubes
Mas em 1993, fiquei sabendo de um clube da cidade que estava abrindo treinamentos para basquete. Combinei com quatro amigos e fui até lá para conversar com o técnico e marcar um amistoso.
O amistoso nunca aconteceu, pois o treinador me viu por dois minutos e pediu para eu ficar ali. Basicamente, o que eu fazia era pegar rebotes, defender e empurrar o cara mais alto do outro time para fora do garrafão. Ele gostou e fiquei.
De novo, eu não era exatamente o típico jogador de basquete jovem brasileiro. Fazia quatro, seis pontos, mas pegava 12 rebotes. Não me importava em pontuar, pois eu tinha lido um livro sobre as funções e gostei de ver um cara que era do Detroit Pistons e estava indo para o San Antonio Spurs.
Um dia, esse técnico me colocou para marcar um jogador de quase dois metros. Quando acabou o jogo, ele me contou que aquele cara tinha 18 anos e não fez nenhum ponto enquanto eu estava em quadra.
Não dá para ficar triste com uma informação assim.
Disputei alguns campeonatos entre colégios e clubes até entrar para a faculdade.
Campeonato Municipal
Apesar de o basquete crescer muito naquela época (tinha transmissão de NBA e torneios nacionais na Band), jogar ainda era uma tarefa difícil. Afinal, não havia um torneio fora daqueles curtos, com quatro times. E viajava para enfrentar times de Ribeirão Preto, Franca e Uberlândia, mas nunca passava disso.
Então, já em 2000, criaram um campeonato em Uberaba com oito times. No ano seguinte, a mesma coisa.
Mas parei por aí.
Com uma filha nascida em fevereiro de 2001, eu não tinha tanto tempo assim para treinar ou jogar basquete. Era trabalho e faculdade. Mas não sei o que me deu que fui fazer direito ao invés de jornalismo.
Parei de jogar campeonatos, mudei de país, voltei (só aí fiz jornalismo) e, em 2006, ao lado do Tiago Vasconcelos, criei a ideia do que seria o Jumper Brasil. Ele cuidava do visual do site, enquanto eu ficava com o pessoal da redação. Não havia tempo para jogar ou treinar. Nada.
O tempo passou.
NBU
Em 2018, já com duas filhas e morando em Uberlândia, vi nas redes sociais que havia um campeonato chamado NBU. Só que em Uberaba. Ali, os caras publicavam estatísticas de jogadores, placares e tudo mais.
Por que não tinha isso na época em que eu jogava? Mas, tudo bem.
Então, em 2020, voltei para Uberaba. Mas como o mundo parou, não houve mais campeonatos naqueles anos.
Um amigo me chamou para jogar basquete com aquele mesmo pessoal de 20 anos antes. Voltei, mas com 30 quilos depois. Foi difícil, pois tentava fazer as mesmas coisas daquela época e não conseguia mais.
E o Jumper Brasil dando trabalho para cuidar. Afinal, ao longo dos anos, não fiquei apenas com a redação. Tive de cuidar de comercial, de gerenciar a coisa toda. Então, parei de novo.
2024
Há alguns meses, no entanto, vi que abriram as inscrições para a quarta edição do NBU. Apesar de eu não jogar há mais de dois anos e sabendo minhas (terríveis) condições físicas, resolvi me inscrever.
Teve Draft e acabei entrando no time do Brasil. O NBU de 2024 foi feito em alusão aos países das Olimpíadas. Mas foi muito fácil jogar, porque ali estavam alguns caras com quem joguei na época da faculdade e gostava muito deles: Leonardo “Alegria” e Lucas Natal.
O técnico e principal jogador era Gabriel Almeida, que também fazia parte da organização, assim como alguns jogadores de outros times. Aliás, o Gabriel também comenta jogos do NBB aqui no Jumper Brasil pelo Youtube.
Mas o Gabriel se machucou após o terceiro jogo (vencemos os três). O que era certeza de que estaríamos nos playoffs virou preocupação. Isso porque ele era o cestinha, o organizador de ataque e treinador. Tudo ao mesmo tempo.
Então, houve tempo de inscrever outro jogador no nosso time, o Richard. Irmão de Rafael Mineiro, do Minas, ele é um cestinha incrível, mas não um organizador. Ficou a cargo do Antonio Xavier, um jovem rápido e com capacidade para pontuar e distribuir o jogo, além do Natal.
Espanha e Grécia
Como o nosso quarto jogo foi adiado, a partida aconteceria na noite em que eu teria reunião com uma empresa e não tive a chance de jogar. Mas olha… vencemos por muito e estávamos em primeiro. Enquanto o Gabriel ficava apenas como técnico, alguns jogadores de outros times acharam ruim e ele teve de ficar apenas com a organização.
Daí, o problema: quem iria comandar o time dali?
Resolveram que o Lucas “Babão”, capitão da equipe e eu faríamos isso. Enquanto o Lucas jogava quase toda a partida, eu começava na maioria delas e voltava no segundo tempo. Afinal, muito fora de forma, não tinha muito o que fazer em quadra.
Só que foi uma bagunça. Muita gente falando, muita gente pedindo para entrar e aquele time não estava mais ali para jogar basquete. Era um amontoado de jogadores sem ter alguém para gritar no ouvido deles e explicar o que precisava fazer.
O Gabriel até dava orientações, mas de longe. Afinal, ele seria árbitro ou mesário.
Perdemos para a Grécia. Um jogo em que lideramos, mas não conseguimos fechar.
Nigéria e França
Após uma bronca do tiozão aqui, o pessoal começou a me ouvir. Mas, mesmo assim, perdemos para a Nigéria e a França. Como resultado, caímos para o terceiro lugar e disputaríamos o play-in. O Gabriel ainda conseguiu ficar com a gente no banco contra a França, mas tudo se repetiu: não sabíamos fechar jogos.
Play-in
Primeiro, enfrentamos a Grécia. Após perceber que não estava funcionando o ataque, a solução foi colocar o Richard, o cestinha, na segunda unidade. A bola rodou mais e, com uma defesa muito forte, vencemos o time que tirou nossa invencibilidade.
Então, pegamos Porto Rico e vencemos de novo. Estávamos na final, que seria decidida em melhor de três. Ou seja, quem vencesse dois, ficaria com o título.
Final
No primeiro jogo, o Gabriel voltou ao nosso banco e comandou o time. Vitória tranquila, sem grandes problemas. Não joguei, pois estava com fortes dores nas costas. Sou velho, lembra?
Na noite de segunda, o time inteiro foi treinar, mesmo sabendo que jogaria no outro dia. Saímos de lá pensando que ainda estava zero a zero, mas com a certeza que era só aplicar o que fizemos ali que poderíamos vencer.
Problema…
Para o segundo jogo, na noite de terça-feira, o Gabriel pediu para não ficar ali no banco. Então, chamei o Babão e escalamos rapidamente o time.
Apesar de alguns erros no primeiro quarto, a equipe funcionou quando começamos a fazer marcação individual. A Nigéria parou de pontuar e abrimos 20 pontos ao fim do primeiro tempo.
Enquanto eu pedia para fazerem o box out (tirar o cara grande deles do garrafão), o pivô da Nigéria pegou 23 rebotes, sendo 14 no ataque. O tiozão aqui ficou feliz, né? Imagine só… Mas eles só pontuavam na terceira ou quarta chance.
E como o nosso ataque estava funcionando e a diferença estava sempre em torno dos 15 pontos, pedia tempo apenas para que eles respirassem.
No fim, vencemos e fomos campeões.
Jogar basquete é muito bom
Aos 46 anos, há dois sem pisar em uma quadra e há 23 da última vez que disputei um campeonato, estar ali foi um presente. Claro, não consigo mais correr como os jovens ou pegar rebotes. Até porque não saio do chão por mais do que meio milímetro. A gravidade chegou aqui, mas vamos dando um jeito.
De qualquer forma, jogar basquete ao lado de caras que realmente queriam ser campeões de um torneio municipal fez toda a diferença. Era um grupo unido e todo mundo sabia o que tinha de fazer.
Claro que vencer é legal, mas só de fazer parte de um time, já foi uma experiência única. Éramos como um grupo de amigos. A gente conversou por grupo, por chamada de vídeo, elaborou táticas, conversou sobre vários assuntos.
A sensação de receber uma medalha e um troféu é incrível. Mas fazer parte de algo assim? Eu não esperava mais. A alegria de jogar basquete foi, acima de tudo, um “combustível” para todos que estavam em quadra.
O time
Não tenho como não agradecer muito a cada um que esteve ali. Então, faço um por um.
Gabriel Almeida
Excelente técnico e jogador, entende tudo de basquete. Uma pena a lesão, mas conversar com ele sobre o time me levou para um tempo em que eu não esperava viver mais. Um amigo.
Lucas Natal
Armador, ouvinte, palestrante sobre qualquer assunto e defensor chato. Era com ele quem eu conversava sobre cada jogada, cada decisão. Se éramos amigos antes, agora somos ainda mais.
Antonio Xavier
O rapaz é ótimo tecnicamente, capaz de infiltrar contra qualquer defesa, pegar rebote ofensivo, brigar por todas as posses de bola, mas fica bravo com ele mesmo. Mesmo depois do título, pediu desculpas. Ora, por que? Foi um prazer jogar com ele.
Caio
Menino novo, que lembra o Ja Morant. Com treinos, ele vai longe.
̶E̶d̶e̶r̶s̶o̶n̶ DJ Nenê
Um dos mais experientes, soube aproveitar seus momentos em quadra. Reclama, mas já viu alguém mais velho sem reclamar? Brincadeirinha.
Richard
Quase me matava de raiva, mas passou a bola nos playoffs. Adivinhe? Mesmo assim, foi cestinha.
Gustavo
O cara não tinha muita experiência com basquete, mas com 1,77m (de tênis, se muito), consegue enterrar e colocar o caos na defesa adversária. Assim como o Caio, se treinar vai longe.
Lucas “Babão”
A alma do time. O cara respira basquete e joga muito nos dois lados da quadra. Um líder, alguém com quem aprendi muito.
Cesar Militão, o Cesinha
Apesar de sentir dores em todos os jogos, ele estava lá. Brigava a cada posse, conversava, dava ideias e dicas.
Leo “Alegria”
Voltei a jogar no mesmo time dele após 23 anos e foi demais. O apelido é justo. Está sempre rindo, brincando com adversários, puxando o time para cima.
Roosvelt “Arroz”
Não ia com a cara dele. Sério. Há muitos anos, discutimos em quadra depois de uma falta que fiz. Mas o mundo dá voltas. Humilde, colega, amigo. O cara opinava, enquanto sabia o que fazer em quadra e fora dela. Foi um prazer jogar basquete com ele.
Basquete
Voltar a jogar depois de muito tempo é legal. Mas fazer parte de um grupo, é melhor ainda.
Claro, é um torneio municipal, mas nunca vi um tão bem organizado, com torcida e muita gente que gosta do esporte. Jogar basquete em um país como o Brasil é um desafio. Hoje, a coisa está um pouco melhor, mas ainda é difícil. Imagine fazer um torneio com uns 50 jogos em pouco mais de dois meses.
Para aquele jovem que está começando a jogar e gosta do esporte, não abandone. Nem que seja por recreação, como hobby.
Aqui, é um depoimento (enorme) de quem se arrepende por ficar tanto tempo longe das quadras e ama o basquete. Por mais campeonatos assim, por mais gente que queira ensinar.
A gente só torce para que este esporte cresça cada vez mais.
Obrigado, basquete.
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