Uma partida inesquecível

Renan Ronchi conta o que aconteceu em um jogo envolvendo Los Angeles Lakers e Chicago Bulls

Fonte: Renan Ronchi conta o que aconteceu em um jogo envolvendo Los Angeles Lakers e Chicago Bulls

Todos que acompanham qualquer esporte coletivo com mais afinco acabam se encantando com algum jogo que não entra nos livros de história. Uma partida simples de temporada regular, uma atuação abaixo da média daquela lenda que tanto fez pelo jogo. Mas que por algum motivo em específico aquele momento ficou marcado em sua memória. Um jogo em específico que me marcou de forma inexplicável foi a primeira vez que assisti ao vivo um jogo da NBA. Era 17 de dezembro de 1996. Eu tinha 8 anos e calhei de ter um parente que foi transferido para Chicago em seu trabalho. Quando assisti a peleja, não tinha conhecimento do nível de detalhes que vou relatar nesse texto. Mas certamente algumas situações históricas aconteceram nessa partida.

O time da casa era o Chicago Bulls. Bulls de Michael Jordan, Scottie Pippen e Dennis Rodman. Bulls que vinha da temporada mais vitoriosa da história da NBA, quando fez uma campanha estupenda de 72 vitórias em 82 jogos disputados e passou com propriedade sobre Miami Heat, New York Knicks, Orlando Magic e Seattle Supersonics para se sagrar tetracampeão da liga norte-americana.

O time visitante era o Los Angeles Lakers. Lakers que na temporada anterior havia sido presenteado com o retorno de Magic Johnson como jogador, mas que algumas desavenças internas haviam tornado o time inconstante e eliminado no primeiro round dos playoffs pelo Houston Rockets de Hakeem Olajuwon. Magic estava considerando voltar para a temporada seguinte, mas optou pela aposentadoria definitiva e a franquia sentiu que era hora de mudança. Mandou o pivô Vlade Divac para o Charlotte Hornets em troca de um menino de 17 anos chamado Kobe Bryant e assinou com o renomado pivô Shaquille O’Neal para os próximos anos. Aqui, cabe um parêntese: sim. Faltou muito, muito pouco para vermos Magic Johnson, Kobe Bryant e Shaquille O’Neal dividindo a quadra com a camisa roxa e amarela. Já pensou?

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Os elementos para colocar esse jogo acima da média eram muitos. Lendas do passado, presente e futuro estavam em quadra. Robert Parish e Byron Scott, outrora protagonistas de duelos fantásticos entre Celtics e Lakers nos anos 80, agora traziam experiência vindos do banco de reservas. Jordan, Pippen, Rodman e Shaq estavam entre os principais nomes da NBA naquele ano. E o jovem Kobe tinha seus 10 minutos por jogo quando Eddie Jones e Elden Campbell estavam descansando. Seria o primeiro encontro de O’Neal com o Bulls desde que este varreu seu Orlando Magic nas finais de conferência no ano anterior. Também seria a primeira visita de Kobe à Chicago e a primeira vez que jogaria contra seu herói. Ainda estava cedo, mas a franquia de Los Angeles estava sedenta para retomar a tocha do Bulls e voltar a ser a equipe a ser batida na liga.

Prova disso foi a agressividade com que jogaram desde o primeiro minuto de jogo. Com Jordan mal nos arremessos e Bill Wennington sendo a principal ameaça ofensiva do Bulls (oi?!), o Lakers impôs seu ritmo, aproveitou a dificuldade do Bulls de marcar Shaq e abriu 36 a 22 logo no primeiro quarto. Nick Van Exel também estava pegando fogo, acertando arremessos de todos os cantos da quadra. No começo do segundo quarto, a vantagem para o time visitante chegou à 20 pontos e o menino Kobe foi chamado para a quadra. Enquanto se levantava, um de seus companheiros de time no banco de reservas apontou para Jordan e falou: ‘Ei, quer um conselho? Não encare ele diretamente nos olhos’. Kobe ficou perplexo e retrucou: ‘O que? Tá maluco? Eu também tenho instinto assassino. Ele também não deve me encarar nos olhos’.

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Kobe entrou no jogo, fez uma boa defesa em Pippen e acertou uma bola de três em seguida. Não demorou muito até ter a oportunidade de marcar seu ídolo pela primeira vez. Parish vem para o corta-luz. Uma finta, MJ gira para o lado oposto e SLAM! Enterra com facilidade após se desvencilhar do camisa 8. ‘Welcome to the big leagues, rook!’ vibra Doc Rivers, então comentarista de televisão. Apesar disso, Jordan ainda não estava em suas melhores noites (viria a acertar apenas 10 de 32 arremessos), e Pippen segurava as pontas enquanto o time de Los Angeles mantinha a liderança. No final do terceiro quarto uma boa jogada da dupla de novatos Fischer e Kobe colocou a diferença no placar em 18 pontos e Pippen com 5 faltas. Em pleno United Center. Contra o Bulls! Não era qualquer um que fazia isso na época.

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Mas aquele Bulls não é considerado um dos melhores times da história do basquete à toa. Uma das viradas mais espetaculares da temporada estava a caminho e o último quarto foi show dele. Jordan? Pippen? Rodman? Phil Jackson?! Nenhum deles. TONI KUKOC. O croata fez chover nos minutos finais, acertando seis cestas inacreditáveis de três pontos que colocou os donos da casa no jogo. A partir daí, o clima de jogo 7 de playoffs estava estabelecido. As defesas assumiram o destaque do jogo, que ficou mais físico, agressivo e pegado. Kukoc parte para a cesta e BAM! Tocasso de Shaquille O’Neal, que seria o de número 900 em sua história na NBA. Randy Brown disputa uma bola com Eddie Jones e a ‘turma do deixa-disso’ precisa separar os dois. Dennis Rodman faz uma falta surreal em Shaquille O’Neal que sequer flagrante é marcada. E Toni Kukoc acerta os dois lances-livres que empatam a partida.

Prorrogação no United Center!

A vontade de vencer de ambos os times continuava à flor da pele, mas isso não se refletia em cestas. Jordan e Shaq estavam errando layups e jogadas que jamais pensaríamos que fosse possível. Van Exel era o único jogador pontuando pela equipe do Lakers, amplamente desgastada apesar do elenco mais novo. Michael Jordan acerta uma cesta de três crucial que quebra um novo recorde na liga: pela primeira vez na história três jogadores do mesmo time chegavam à trinta pontos ou mais no mesmo jogo (Jordan com 30, Pippen com 35, Kukoc com 31).

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Com o jogo ainda disputado, um quarto herói despontou para terminar o serviço. Com 25 segundos para o fim da prorrogação e o placar em 125-123 para os donos da casa, Eddie Jones chuta de 3. A bola bate no aro e dá rebote. Dennis Rodman, que até o presente momento estava com 0 pontos e 16 rebotes no jogo, salta completamente esmagado entre Shaquille O’Neal e Jerome Kersey e de alguma maneira inexplicável alcança a bola antes dos dois, imediatamente a leva em seu peito e pede um tempo. Virtualmente, o jogo estava decidido. Após o lance, Rodman e Kersey se estranham e Shaq, provavelmente ainda irritado pela falta dura marcada por Rodman no quarto período, empurra com força o jogador. Antes que Rodman encostasse em qualquer um vestindo uma camisa amarela, Jordan e Pippen imediatamente seguram e puxam o ala-pivô para longe e uma cena épica estava montada. O trio caído no chão, com Rodman tentando se levantar e Pippen gargalhando da situação. O ginásio abarrotado pulsando. Três jogadores segurando O’Neal. Dezenas de reservas em quadra. Um dos raros momentos que as torcidas norte-americanas vibram como se estivessem vendo uma final de Libertadores da América.

Com a sexta falta de Eddie Jones, Kobe voltou ao jogo. Assistiu Rodman converter seus dois lances-livres, sofreu falta e errou os dois lances que bateu. Dois pontos e 18 rebotes para Rodman. Vitória do Chicago Bulls por 129 a 123.

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E você? Possui algum jogo inesquecível em sua memória?

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