Fotografias são altamente esclarecedoras a respeito de diversas situações. Uma pose, um flash e pronto: há uma memória, uma recordação, uma explicação a respeito de uma fração de tempo já ali eternizada em papel. Há até um ditado que alega que “uma imagem vale mais que mil palavras”. Todavia, fotografias podem suscitar algo mais a respeito do cenário exibido, das personagens envolvidas, do tempo eternizado.
A fotografia da temporada 2016-2017 da NBA até o presente momento mostra o atual campeão, Cleveland Cavaliers, como líder da Conferência Leste da Liga com aproveitamento baseado na casa dos 70%, em direção a um franco favoritismo em direção a mais uma final. Um recorte mais específico, mais detalhado, com zoom profissional, entretanto, mostra um mês de janeiro de 2017 não tão rebuscado assim.
Recapitulemos: o Cavaliers teve um recorde negativo no período do mês que se encerrou há pouco. Em 15 partidas, o time liderado por LeBron James obteve sete vitórias contra oito revezes. Esta foi a primeira vez, desde fevereiro de 2006, que James atuou por um time com recorde negativo em um mês que acumulasse ao menos dez partidas – o Cavs de outrora teve um recorde de seis vitórias e oito derrotadas naquela oportunidade.
LeBron, aliás, envolveu-se em dois casos que ecoaram pela mídia norte-americana. O primeiro deles foi sua insistente pedida, desde dezembro do ano passado, por mais um armador para a equipe: um atleta criador de jogadas que pudesse substituir e descansar Kyrie Irving, e liberar ambos – James e este último – de tantas responsabilidades na criação de jogadas ao carregar a bola. Em tom de cobrança, alegando que aquela “era a última vez em que falava” sobre o assunto, o pedido soou como uma ameaça à direção da equipe. Panos quentes colocados pelo treinador Tyronn Lue e pelo gerente-geral David Griffin na situação, James então não queimou a língua contra Charles Barkley, abrindo fogo contra o antigo ala.
Atualmente comentarista e âncora de TV nos Estados Unidos, o ex-atleta declarou em rede nacional que James era um jogador “chorão”: que reclamava de barriga cheia, gostaria de ter todos os bons jogadores para si, e ainda indagava o três vezes campeão da NBA se ele não queria competir com os outros times. Tiros disparados. James, pela mídia, xingou Barkley, relembrou problemas extra-quadra já conhecidos do MVP da NBA em 1993, alegou que nunca desrespeitou o basquete como Barkley já teria feito, e que não deixaria mais o comentarista tentar destruir seu legado como vinha fazendo em suas declarações: “dane-se o Barkley”, finalizou. Mais tiros disparados.
Muitos alegam que o Cavaliers enfrenta uma crise. Atual campeão, viu o poderio do vice-campeão Golden State Warriors aumentar com a aquisição do ala Kevin Durant no ano passado, algo que poderia atrapalhar o caminho rumo ao bicampeonato. Lesões que acometem os titulares Kevin Love (espasmos e dores nas costas que, ainda, não o impedem de atuar, mas limitam seu jogo) e J.R. Smith (dedão da mão direita fraturado já operado, com expectativa de retorno pouco antes dos playoffs). Queda de produtividade no começo do ano, mesma época em que o ex-treinador David Blatt foi sacado do cargo, em 2016, em favor de Lue, anteriormente um assistente, ainda que líder de sua conferência naquela ocasião. Ou seja: crise. Crise? Vamos dar um zoom mais aproximado, abrindo o ângulo dessa lente.
O Cavaliers ainda possui o melhor jogador do mundo. Um dos melhores atletas da história da NBA e, possivelmente, dos esportes americanos em todos os tempos. Com o final de sua carreira, é possível que James seja considerado o melhor ala da posição 3 (small forward) a já pisar em uma quadra de basquete. Irving ainda é um dos melhores armadores da Liga, e suas atuações decisivas em momentos finais de jogo já o fazem ter mais a bola nas mãos para o arremesso da vitória do que mesmo para com James. Love integra o time do Leste do All Star Game daqui a poucos dias, em meio a contusões, realizando ainda um sólido jogo ofensivo e aprimorando sua defesa. A base da equipe, recheada de role players interessados no título e em compor a história junto às estrelas, ainda possui bons valores como Tristan Thompson, Iman Shumpert, Kyle Korver e o já citado Smith. Se tudo isto pouco fosse, poderia a franquia se preocupar com os concorrentes ao redor no Leste. Poderia? Precisaria?
Entre o segundo colocado Boston Celtics ao quinto lugar Atlanta Hawks, o Cavaliers já enfrentou em sua conferência as principais ameaças, juntamente ao terceiro posto Toronto Raptors e ao ascendente quarto lugar Washington Wizards. Num total de sete partidas até agora disputadas na temporada regular, perdeu apenas uma vez, para o Hawks, por 110 a 106 – margem irrisória. Na fotografia que remonta o período entre 28 de outubro e 15 de novembro de 2016, ambas datas de vitórias contra o Toronto Raptors, o time de Cleveland ainda ganhou uma partida do Celtics e outra do Wizards, só havendo o já citado revez para o time de Atlanta em 8 de novembro, no estado de Ohio.
No total, já são três vitórias contra o Raptors (resta uma partida na temporada regular), duas contra o Celtics (serão mais duas adiante) e há outras três chances de devolver a derrota ao Hawks, sendo duas dessas partidas um back to back em 7 e 9 de abril. O próximo teste contra a elite do Leste é contra o Wizards, em Washington, onde o time da casa não perde há 15 pelejas, em 6 de fevereiro, restando ainda um confronto no final de março. Na pós-temporada passada, o mesmo Hawks que já bateu o Cavaliers na atual época foi varrido em quatro jogos na semifinal de conferência. O Detroit Pistons também foi varrido, na fase anterior, e o Raptors conseguiu ganhar duas partidas na série final de conferência perdida para o Cavs. O Wizards nem mesmo à pós-temporada chegou em 2015-2016, apesar da mesma linha inicial de agora. E agora: é de se preocupar, ou nem tanto assim?
Não é, claramente, uma situação de prepotência ou arrogância. Porém, a dominância silenciosa que o time de Cleveland vinha impondo em sua conferência não chamou tanta atenção quanto o momentâneo desequilíbrio em que o time se encontra atualmente. Mesmo com o recorde negativo em janeiro, o Cavaliers lidera sua conferência com mais de dois jogos à frente do Boston Celtics até a data de 02 de fevereiro de 2017, quando os dados foram coletados e este artigo escrito.
Enquanto a conferência Oeste recebeu holofotes por conta das estrelas e jogo atrativo do Warriors, por outra sólida campanha do San Antonio Spurs, pela espetacular liderança de James Harden sobre o Houston Rockets e pela matematicamente fantástica temporada de Russell Westbrook no Oklahoma City Thunder, o Leste esteve silencioso, silenciado, ligeiramente fora de foco.
Nada dito anteriormente apaga o fato de que o Cavaliers ainda é, sim, o melhor time daquela conferência e, ainda é, sim, amplo favorito ao seu título “doméstico” e ao direito de chegar a mais uma final da Liga: seria a sétima seguida para James, a oitava de sua carreira de 14 temporadas. Se o camisa 23 escolheu um caminho aparentemente mais curto ou fácil para imprimir sua marca na história, bem, isto é discutível e variável em termos de opinião. Argumentar, porém, que há uma crise ou mesmo adversários capazes de tirar a coroa do time de Cleveland do lado Leste da NBA é, sem sombra de dúvida, muito mais complicado.
Avaliar o Cavaliers não é questão de um flash apenas e pode levar até mesmo o tempo em que se folheia um álbum por inteiro, mas não conte com o time fora da pose final nos palcos maiores no final da temporada. Anéis de vencedores da NBA são difíceis de se conquistar, mas são acessórios que chamam muito a atenção nos retratos que ficam eternizadas para sempre: em mais uma tentativa pelo banner de campeão, o Cavaliers deve continuar aparecendo bem na fita – e na foto.