A eliminação do Los Angeles Lakers na primeira rodada dos playoffs jogou a equipe, precocemente, em uma offseason agitada. Só cinco jogadores do elenco não possuem qualquer envolvimento com a agência livre, com contrato totalmente garantido para a próxima temporada: os astros LeBron James e Anthony Davis, além de Kyle Kuzma, Kentavious Caldwell-Pope e Marc Gasol.
Não estar envolvido com a agência livre não quer dizer, porém, vida tranquila e posto assegurado nos próximos meses. Já pode apostar que especulações sobre Gasol estar pensando em voltar ao basquete europeu para encerrar a carreira surgirão em algum momento. Enquanto isso, como alguns dos poucos contratos garantidos do elenco, é inevitável que Pope e Kuzma sejam especulados em trocas.
Não estou aqui para realizar a análise completa da offseason do Lakers, mas para falar sobre os dois casos mais interessantes e raros desse grupo de agentes livres – e, por isso, os atletas potencialmente mais visados pelos concorrentes no mercado e com a tendência de saírem mais “caros” do que o esperado em um novo contrato. O que é possível, então, dizer sobre as situações de Alex Caruso e Talen Horton-Tucker?
Caruso foi, provavelmente, o “achado” mais raro do Lakers nos últimos anos. Trata-se de uma descoberta maior do que contratação aleatória ou escolha de draft – e, aliás, eles encontraram muita coisa boa em recrutamentos recentes. Simplesmente não há muitos role players na liga com a combinação de capacidade defensiva, criação para outros, arremesso competente e inteligência do ala-armador e xodó da torcida.
Esse é um mix de habilidades que só costumamos ver – em maior ou menor grau, é verdade – em astros (Paul George) e veteranos supercapacitados para a função que exercem (Andre Iguodala). E, certamente, ninguém pagou apenas US$3 milhões em salários nas últimas duas temporadas para ter esse atleta entre os 25 e 27 anos de idade, após já ter tido um papel importante em um time campeão.
É seguro dizer que Caruso não é um astro em potencial, mas estamos falando de um atleta bastante completo para o que a NBA pede de alguém exercendo a sua função recebendo um salário irrisório para o que ofereceu aos atuais campeões – ainda que nem sempre seja totalmente bem aproveitado. Não é à toa que, se você lembrar de todos os grandes momentos recentes dos angelinos, identificará o reserva com uma participação maior do que o esperado (ou do que deveria).
Cada um tem seu modus operandi sobre como montar um elenco campeão, mas, em geral, o que você precisa é trazer astros e encontrar um grupo de atletas periféricos, coadjuvantes, que “combinem” com esses nomes maiores. Que joguem bem ao lado deles e façam com que esses craques joguem (ainda) melhor. Pois Caruso tornou-se uma peça tão importante do Lakers porque comprovadamente faz isso.
Na atual temporada, ele foi o único jogador de rotação angelino a estar entre os três melhores net ratings (saldo de pontos por 100 posses de bola disputadas) tanto nos minutos atuando ao lado de LeBron, quanto no tempo de quadra com Davis.
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Minutos | Eficiência Ofensiva | Eficiência Defensiva |
Net rating |
LeBron/Caruso | 397 | 114.2 | 97.1 | +17.1 |
Davis/Caruso | 339 | 111.8 | 102.5 | +9.3 |
Caruso registrou o terceiro melhor net rating entre todos os atletas de rotação de Frank Vogel na temporada, só ficando atrás de LeBron (11.2) e Gasol (11.1). É com o quatro vezes MVP da liga, porém, que os números ficam realmente incríveis: o saldo de 17.1 pontos por 100 posses de bola não são somente o melhor índice de qualquer atleta de rotação do time com o “King”, mas o melhor de qualquer dupla que jogou mais de 80 minutos junta pelos angelinos nessa campanha.
Eles jogaram cinco vezes mais do que esse tempo mínimo. E simplesmente 77 duplas atuaram mais do que 80 minutos pelo Lakers nessa temporada. LeBron e Caruso foi a melhor entre todas elas.
O perigo que reside em um jogador como Caruso na agência livre é que trata-se de uma observação fácil para outras franquias: os rivais sabem que é um jogador em constante evolução, com postura aguerrida, jogo bastante completo e – acima de tudo – foi muito mais importante do que se poderia imaginar para o título de 2020. Tudo indica que ele pode assumir um papel maior do que a reserva de Los Angeles. É um campeão.
Eu já posso ver um time como o Sacramento Kings ou Cleveland Cavaliers oferecendo um grande contrato para o ala-armador ser titular absoluto, pelos US$12 milhões por anos especulados, com a confiança dos Power Rangers invocando Titanus. E isso até que, provavelmente depois de uma temporada, percebam que ele é bem melhor em uma equipe campeã do que tentando alavancar um time ruim aos playoffs. É ótimo complemento, mas não alguém em quem se basear.
O que você nota quando vai além do básico é que Caruso é um bom defensor, técnico e inteligente, mas não estamos falando de uma força disruptiva no perímetro nos moldes de Marcus Smart ou Tony Allen. Ele acertou mais de 40% dos seus arremessos de três pontos, mas não é um chutador dinâmico por natureza e havia convertido só 33.3% de suas tentativas na temporada passada. Gera arremessos para companheiros, inclusive executando o pick-and-roll bem mais por ser um passador inteligente do que criativo.
Talvez, a melhor alternativa para que o Lakers consiga gerir disponibilidade salarial e manutenção do elenco seja deixar que Dennis Schroder – cuja renovação deve sair caríssima – vá embora, acerte a permanência de Caruso e promova o jogador ao seu quinteto titular na próxima temporada. Essa é uma alternativa em que já pensava e acabou surgindo em uma conversa com os meus colegas do podcast Jumper Front Office, torcedores do time roxo e dourado, Ricardo Romanelli e André Mori.
Enquanto os angelinos tiverem LeBron, convenhamos, o armador nominal da equipe sempre vai ser um atleta que atue muito mais sem a bola (realize jogadas rápidas e inteligentes a partir da reação dos adversários, corte para a cesta e faça bloqueios, espace a quadra e defenda). Com Caldwell-Pope, já vai existir um outro jogador de perímetro capaz de defender o melhor oponente – isso sem contar, em momentos pontuais, o próprio LeBron.
Aposto que vai doer em Frank Vogel não ter mais um cara como Caruso no banco de reservas, alguém que simplesmente possa colocar em quadra e “preencher as lacunas” atacando o que quer que o Lakers precise. Mas mantê-lo é algo por que todos clamam em Los Angeles e acho que o seu impacto nas vitórias recentes da equipe é muito mais vital do que o de Schroder, que pode sair até US$10 milhões anuais mais caro.
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Talen Horton-Tucker, por sua vez, é um capítulo raro porque esse tipo de agente livre não costuma surgir em um candidato ao título ou atual campeão: uma pérola, um atleta saindo do contrato de novato visado por outros times, percebido até como um astro em potencial, que teria média de uns 10 minutos a mais por partida em uma equipe menos competitiva. O fato, porém, é que ele somou somente 48 minutos de ação pelo Lakers nos seis jogos disputados nos playoffs – em dois deles, sequer entrou em quadra.
Jovens jogadores em final de vínculo de calouro em elencos campeões costumam já ser contribuintes sólidos para times competitivos, atletas de habilidades específicas facilmente substituíveis ou simplesmente escolhas “desperdiçadas” de final de primeira rodada. Não existe, geralmente, esse aparente enorme talento que tem pouco espaço para o seu desenvolvimento. É uma peça que já teria sido negociada por um veterano provado ou até como parte de pacote por um astro.
Sejamos frios aqui: com Horton-Tucker, por mais que acredite no talento, você estará pagando de US$10-15 milhões anuais para um atleta que jogou 20.1 minutos por jogo nessa temporada, anotando 9.0 pontos com 28.2% de aproveitamento nos arremessos de longa distância. Está pagando, claramente, pelo que ele pode se tornar. E esse é o ponto: contenders não pagam por potencial. Quem faz isso, hoje, são franquias como Detroit Pistons e Oklahoma City Thunder.
Isso é ainda mais válido quando falamos de uma equipe campeã que foi eliminada na primeira rodada dos playoffs e se vê obrigada a procurar reforços, enquanto estuda a permanência de 2/3 do seu elenco. A verdade é que o dinheiro que o Lakers investirá, provavelmente, no ala-armador de 20 anos é o que os seus principais oponentes pelo título estão pagando por atletas como Jae Crowder, Joe Ingles, Seth Curry, Brook Lopez, Serge Ibaka e Spencer Dinwiddie.
A moral da história é simples: franquias na condição atual dos angelinos investem em jogadores consolidados, veteranos provados que vão ajudar a competir no mais alto nível. Não dá para colocar US$12 milhões por ano ou coisa assim em um jogador que poderá ser uma de suas principais peças de rotação em 2022. É preciso investir em alguém que tenha certeza de que vai ser uma de suas principais peças de rotação em 2022.
Os tempos são outros, mas, basicamente, bem-vindo ao dilema de LeBron: ele deixou terra arrasada no final de suas duas passagens pelo Cleveland Cavaliers, em parte, porque você “sacrifica” ativos futuros por ajuda imediata na intenção de aproveitar o intervalo de tempo em que conta com um dos melhores jogadores da NBA. Digo “em parte” porque isso também passa pela incompetência gerencial das franquias, óbvio. Miami não sofreu tanto quanto o Cavs, como comparativo.
Horton-Tucker, hoje, é um talento empolgante por ser analisado como um empolgante talento. Nós não avaliamos atuações inteiras dele, mas sim quatro ou cinco dos seus melhores momentos, aqueles flashes inegáveis de potencial em várias áreas que vão para a televisão, as redes sociais e os fóruns do Lakers. Não temos ideia sobre o que “THT”, como é conhecido, realmente é como jogador no momento porque todas as discussões giram em torno do que ele pode vir a ser.
E, convenhamos, os seus quatro ou cinco melhores lances por partida são fantásticos mesmo. É o cara que rouba a bola de James Harden em um isolation, consegue uma bandeja acrobática contra James Wiseman e Draymond Green, acerta cesta de três pontos decisiva na prorrogação contra o New York Knicks, marca 33 pontos em uma partida de pré-temporada e dá passes de quadra inteira (outlet) para achar Anthony Davis sozinho em transição. Só que tudo isso nunca acontece no mesmo jogo.
Esse é o grande encanto que existe em torno de Horton-Tucker: diferente de outros jovens talentos com jogos bem definidos e habilidades específicas, que temos ideia sólida do que vão ser, ele pode partir em vários caminhos diferentes porque parece mostrar capacidade de desenvolver em inúmeros sentidos. A cada partida, os seus flashes sinalizam para um repertório um pouco diverso.
A parte esses diferentes flashes, o que a escolha de segunda rodada do draft de 2019 mostra de forma consistente é uma capacidade especial para realizar as infiltrações, quebrar defesas e finalizar em torno do aro com enorme criatividade. Isso já começa pelo fato de estamos falando de um ala-armador bem raro em termos físico-atléticos, com seus 2.15m de envergadura e mais de 106 quilos. Ele é forte, “parrudo” e longo demais para quem só deveria ter 1.93m de altura.
E Horton-Tucker sabe realmente fazer isso converter-se em seu favor: é um infiltrador extremamente físico, que sempre está em busca de contato como referência. Em uma liga com formações cada vez mais leves, o jovem angelino ganha espaço em inúmeras jogadas e consegue chegar à cesta simplesmente por ser fisicamente tão fora da curva em relação à concorrência. É uma força em movimento que chega a derrubar pivôs, como pode se ver no vídeo anterior.
Mas seria simplório dizer que esse garoto de 20 anos está só derrubando corpos mais experientes para chegar ao aro, embora isso seja parte da história. Ele também ataca com eficiência por conta de fantástico controle corporal pós-contato e trabalho de pés, desacelerando o movimento de ataque com imensa coordenação. Ele procura um jogo físico não só porque é mais forte, mas por saber lidar com contato como um veterano.
Então, próximo da cesta, ele usa os seus braços longos para finalizar e pode lidar até com situações bastante complicadas – fintar eventuais ajudas e coberturas, com um arsenal de finalizações que variam entre simplicidade e jogadas quase acrobáticas. É capaz de ganhar espaço com sua envergadura para finalizar a relativa distância do aro também. Ser um guard com braços do comprimento de um pivô facilita seu trabalho.
A capacidade de chegar ao garrafão também indica grande potencial de Horton-Tucker no drive and kick, embora, claramente, essa não seja a primeira opção quando ataca o aro. Chegar à área pintada é um dos objetivos que todas as equipes desejam de seus passadores, distribuindo o jogo para espaçadores. Seus braços longos e físico “abrem” linhas de passe que simplesmente não existem para jogadores mais franzinos quando em movimento ou operando em um espaço potencialmente fechado como o garrafão.
É um sinal muito animador que o talentoso atleta tenha distribuído duas assistências por desperdício de bola na temporada, enquanto atuava como armador nominal em algumas partidas onde o Lakers estava mais desfalcado. Há indícios de que o time pode investir no jovem como o seu armador da segunda unidade, mas seria bom que quase sempre estivesse em quadra com Caruso ou LeBron para não ser o criador primário por longos minutos. Ele não é provado o bastante para ter tal função em uma equipe campeã.
E, na linha do que já abordei sobre Caruso, Horton-Tucker tem um grande trunfo para permanecer em Los Angeles em seu encaixe com LeBron e Anthony Davis: ele é o segundo jogador de rotação que teve melhor net rating do elenco roxo e dourado enquanto esteve em quadra junto com os dois astros na temporada. Isso precisa ser visto com reservas, porém, já que foram apenas 43 minutos de ação juntos:
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Minutos | Eficiência Ofensiva | Eficiência Defensiva |
Net rating |
THT/LeBron/Davis | 43 | 111.7 | 86.4 | +25.3 |
O fato do ala-armador ser um agente livre restrito nunca será algo negativo, mas, nesse caso, pode vir a funcionar como uma maldição disfarçada de benção. Ter a oportunidade de igualar as propostas dos outros interessados é uma vantagem inegável para o Lakers, mas, historicamente, é uma mecânica que também incentiva concorrentes a oferecerem contratos maiores do que o esperado para os jogadores – exatamente para inibirem as equipes detentoras do direito de igualarem o valor.
Como já disse anteriormente, os angelinos não podem se dar ao luxo de colocarem uns US$10-15 milhões anuais nas mãos de um atleta para simplesmente “verem o que vai dar”. LeBron nunca pareceu mais mortal e sua janela competitiva pode estar fechando. Acredito que Horton-Tucker poderia ser alçado à condição de armador reserva oficial do time, mas poderia não é bom o bastante. Use a escolha de primeira rodada de draft ou contrato mínimo para trazer outro atleta da função como um tipo de “plano B”.
Você pode imaginar que igualar o valor não é tão crítico porque uma troca sempre será possível, já que trata-se de um ativo jovem dos mais valiosos em contrato manejável. Mas, no fim das contas, é mais simples falar do que fazer. Fechar uma negociação com temporada em andamento limita as suas opções de reforço (quem estará disponível?) em relação à offseason e, financeiramente, as franquias já estão mais “atadas”. Não é NBA 2k, em que tudo está na mesa o tempo inteiro.
Renovar ou não com Horton-Tucker nos padrões em que a negociação se mostra é uma pergunta difícil porque, no fim das contas, trata-se de um risco ainda maior do que as coisas na NBA já são. Seu desenvolvimento, como o de qualquer atleta, passa longe de ser uma certeza – especialmente, em um Lakers que está focado em competir agora e pressionado pela disposição de tempo. Como mostra a sua participação nos playoffs, o caminho para sair da rotação é curto e não há margem para erro.
Ao mesmo tempo, se THT “explode” em outro lugar, Rob Pelinka não vai querer ser o gerente-geral que abriu mão de um grande talento enquanto pagava um contrato bem semelhante para caras como Kyle Kuzma e Kentavious Caldwell-Pope. Acho que, hoje, qualquer torcedor do Lakers aceitar trocar Kuzma para manter o prodígio. Só o GM, no entanto, será cobrado se Horton-Tucker virar… digamos… um novo Kuzma, que empolgou como calouro a ponto de ser “vetado” nas negociações por Anthony Davis.
Sinceramente, para mim, essa é uma decisão muito mais difícil do que Caruso. Não queria estar no corpo de Pelinka para essa questão específica. Ou melhor, pelo seu salário, queria. Só não garantiria acerto. No fim das contas, ninguém pode.
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