Ser campeão da NBA não é para qualquer um. Mais do que talento, é necessário um trabalho intenso da diretoria para colocar ao lado de seus jogadores, pessoas que consigam ditar o ritmo e segurar o ímpeto de um ou outro sem a necessidade de pisar em quadra.
Em meados dos anos 80, Tex Winter foi contratado pelo Chicago Bulls para ser mais do que um coordenador ofensivo. Ele foi chamado para levar ao time de Illinois o famoso triângulo ofensivo, adotado por Phil Jackson até hoje. Somente ali foram seis títulos pela equipe e mais três no Los Angeles Lakers. Winter deixou a franquia californiana em 2008, um ano antes do novo campeonato conquistado pelo Lakers. Jogadores menos cerebrais jamais conseguiram entender o esquema de jogo.
Assim como Winter, o Bulls de Jackson realizou uma troca para receber Dennis Rodman, vindo do San Antonio Spurs. Rodman não era um jogador comum. Era agressivo dentro e fora de quadra, era cheio de tatuagens e de atitudes. Não levava “não” como resposta e voava atrás de jogadas impossíveis apenas para garantir a posse de bola para a sua equipe.
Mas Rodman tinha, digamos, um tutor em seu primeiro ano em Chicago. Era Jack Haley, falecido em março do ano passado.
Para quem não conhece, Haley era um jogador obscuro, sem qualquer tipo de sucesso na liga, mas tratava-se da pessoa que sabia lidar com as loucuras de Rodman. Por dois anos no Spurs, ele fazia o papel de mentor do camisa 91. Haley o acalmava, ouvia suas reclamações e o aconselhava a tentar tomar decisões sem se prejudicar.
Durou apenas uma temporada no Bulls até que Michael Jordan e Scottie Pippen — inimigos de Rodman na época em que o ala-pivô atuava pelo Detroit Pistons — conseguissem entender o que se passava na cabeça colorida daquele jogador. Foram três títulos ali.
Alguém viu Rodman provocar Frank Brickowski, do então Seattle Supersonics? Ou então se enroscar com Karl Malone nas duas finais seguintes? Aquele Rodman não jogaria todas as partidas de uma série na atualidade.
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A NBA de hoje é completamente diferente de duas décadas atrás. Não pode tocar o oponente, não pode fazer o finger wag, que Dikembe Mutombo introduziu à liga. Não pode nada.
Para driblar as regras, cada vez mais rígidas e politicamente corretas, técnicos passaram a adotar uma postura de imposição, de reclamação. Não durante o jogo, pois a falta técnica impera. Mas nas entrevistas.
Apenas nesta edição dos playoffs, três treinadores foram multados após críticas aos árbitros. Primeiro, foi Stan Van Gundy, do Detroit Pistons. Depois, Dwane Casey, do Toronto Raptors. Por fim, Tyronn Lue, do Cleveland Cavaliers. Curiosamente ou não, os dois primeiros reclamavam de faltas marcadas ou não contra o Cavs. Mais especificamente, LeBron James.
Nos casos de Van Gundy e Casey, o resultado não foi lá satisfatório. Ambos foram eliminados pelo Cavaliers e não tiveram seus pedidos devidamente atendidos.
Preocupado com o baixo índice de lances livres marcados para James, Lue foi ao microfone para reclamar publicamente disso. Ele sabia que seria multado. Nas finais do ano passado, LeBron foi à linha 67 vezes em seis partidas (11.2 tentativas), contra 17 nos quatro primeiros jogos da série diante do Golden State Warriors, 4.5 por embate.
Dito e feito.
LeBron cobrou oito lances livres no jogo cinco, quase o dobro de sua média nas finais.
É fato que o aproveitamento do astro é abaixo do esperado (64.2% nos playoffs), mas isso também tem a ver com o ritmo. Se um atleta que não é tão preciso assim fica cada vez mais afastado da linha, menor é seu aproveitamento. Não que seja uma regra, pois James converteu 69% nas finais de 2015. Só que isso mina os oponentes com faltas, força o técnico adversário a fazer ajustes e acaba tendo chances maiores de vencer, de uma maneira ou outra.
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Voltando ao quarto jogo da série, quando LeBron passa por cima de Draymond Green. Ali acontecem duas coisas ao mesmo tempo.
A primeira é que James desrespeita seu oponente. Claro, segundo as regras de hoje. Allen Iverson fez o mesmo com Lue, ainda jogador do Los Angeles Lakers e aquilo tornou-se um marco na NBA. Hoje, LeBron agiu com falta de respeito.
Mas aquele ato sobre Green foi o estopim para a discussão. Errado? Sim. De caso pensado? Com certeza. Ele queria irritar o ala-pivô do Warriors e conseguiu. Ação e reação.
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Era óbvio que a NBA iria entender como provocação, e por isso, James levou a falta técnica. Mas Green caiu nisso e, de um estádio de beisebol, viu LeBron fazer 41 pontos e forçar o sexto jogo. Caiu por ser intenso e moderadamente louco, como Rodman. Faltou um Jack Haley. Faltou alguém dizer a ele que estava pendurado, que já tinha um “cartão amarelo”.
O Cavs ganhou a quinta partida das finais e acima disso, o momento. Terá em Cleveland, a missão de superar o ano passado, quando parou em casa no sexto jogo e perdeu o título para o Warriors.
Nunca é demais lembrar que, se tiver outra falta flagrante, Green estará fora de um hipotético sétimo jogo. Alguém precisa cuidar dele e fazer com que mude de provocado para provocador. O trash talk ajuda, mas nem sempre é o bastante.