Multicampeã, Érika de Souza reflete sobre machismo no esporte e racismo sistêmico

Em entrevista ao Estadão, pivô da seleção brasileira “atacou” diferença de tratamento a mulheres e negros no esporte e na sociedade

Fonte: Em entrevista ao Estadão, pivô da seleção brasileira "atacou" diferença de tratamento a mulheres e negros no esporte e na sociedade

Érika de Souza possui uma das carreiras mais célebres do basquete brasileiro atual. A pivô conquistou os títulos nacional, espanhol, da Euroliga e da WNBA, além de ter disputado três Jogos Olímpicos e quatro Mundiais de Basquete com a seleção. Ela já parece ter alcançado tudo o que poderia e não tem mais nada a provar em quadra. A atleta de 38 anos, porém, tem mais um adversário de frente: a diferença de tratamento entre homens e mulheres no esporte.

“O preconceito para nós mulheres vai muito além. Há um tratamento diferente. Eu tenho todas essas conquistas e nunca ninguém me ofereceu patrocínio. Tem muito jogador que ganhou muito menor, que nunca jogou pela seleção e recebe material esportivo. A única justificativa que enxergo é pelo fato de ser mulher. Temos que falar, incentivar as outras meninas a falarem, porque, caso contrário, vai passar de geração para geração”, alertou Érika, em entrevista ao O Estado de São Paulo.

Depois da publicação da entrevista ao jornalista Marcius Azevedo, a jogadora usou as redes sociais para voltar a retratar a sua indignação com a desigualdade de gênero.

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A pivô consegue citar diversos exemplos de atletas masculinos que recebem apoios e patrocínios, mas procura sem encontrar onde está esse suporte para as mulheres esportistas. “Eu quero entender qual é o critério para escolher quem será apoiado. Tenho um título da WNBA, oito títulos espanhóis, uma Euroliga, LBF, joguei quatro Olimpíadas e sabe quantas marcas já quiseram fechar contrato comigo? Nenhuma. Por que será? Talvez, por que eu seja mulher ou por ser negra?”, questionou.

Érika vê o seu pedido por igualdade como uma súplica para que outras mulheres e gerações do esporte feminino não precisem trilhar um caminho tão potencialmente difícil quanto grandes atletas que vemos hoje em dia. “Graças ao talento que Deus me deu, eu fiz uma carreira que, aos 38 anos, posso deixar as quadras e ter uma segurança financeira. Eu falo aqui pelas meninas que estão jogando e assistindo a essa desigualdade”, completou a veterana.

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A contundência da jogadora não ficou reservada só em questões como o machismo no esporte. Na condição de mulher negra, ela assistiu ao assassinato do segurança negro George Floyd por um policial branco em Minneapolis, nos EUA, em maio, com indignação. Ela reconhece a reação social norte-americana, com protestos e manifestações ao redor do país, mas acredita que é preciso um movimento muito maior para realmente dar fim ao preconceito devido a cor da pele.

“As pessoas foram para a rua e agora ninguém mais sofrerá racismo? Infelizmente, vai acontecer outra vez. As pessoas vão sair novamente, dar a cara a tapa, como fizeram os atletas nos EUA, mas não adiantará. São as pessoas lá no alto, com o poder, que precisam fazer algo para que possamos ter uma mudança. Os policiais precisam ser treinador para lidar com as situações. Eles estão aí para nos defender, não matar. Temos que começar sendo antirracistas”, afirmou.

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Poucos dias após a morte de Floyd, Érika postou um lembrete de uma informação aterrador em suas redes sociais: oito de cada vez assassinatos no Brasil são de pessoas negras. Ela defende que essa não é uma luta que só os negros precisam encarar ou o objetivo não é só não ser racista. É necessário que todos entrem na linha de frente, que sejamos antirracistas. Seu ponto é claro: palavras até podem fazer barulho, mas são as ações que causam mudanças.

“O racismo precisa ser combatido diariamente. Não adianta fazer post na internet, camiseta… Temos que transformar ação em prática. Começar de casa, passando pela escola. Temos que protestar, apoiar, lutar para que isso não aconteça. Nas faculdades, por exemplo, somos uma cota mínima. Por que? Os brancos são mais inteligentes? Ou o negro não pode entrar em uma sociedade de brancos. Todos somos iguais e temos os mesmos direitos”, cravou a atleta da seleção.

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Contratada pelo Sampaio Corrêa, atual campeão da liga nacional feminina, para a disputa do próximo campeonato, Érika segue sem receber salário. Ele só vai ser pago pela equipe maranhense após a apresentação oficial da jogadora multicampeã.

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