Por Ricardo Romanelli
O basquete mudou muito desde sua introdução como esporte. O tipo físico dos jogadores, a execução dos fundamentos, assim como as táticas utilizadas vem sendo aperfeiçoadas e reinventadas ao longo das últimas décadas.
Com isso, vão surgindo novas maneiras de se praticar o esporte, e com isso novas necessidades de desempenho por parte dos jogadores. Dentro desse contexto, observamos mudanças de função em todas as posições tradicionais de uma tática de basquete. No entanto, nenhuma posição teve salto de qualidade mais acentuado do que a do ala-pivô.
No começo, era tudo bastante simples. Os dois alas infiltravam. Os dois pivôs trabalhavam dentro do garrafão. O armador distribuía a bola entre eles. A partir daí, surgiram novas necessidades e novas táticas. Um dos alas auxiliava o armador e infiltrava menos, e com isso nasceu a figura do ala-armador (ou shooting guard, para os americanos).
Este equilíbrio tático já está bastante sedimentado, uma vez que desde os tempos de Jerry West já temos alas e armadores jogando de maneira similar a hoje. No entanto, o garrafão levou mais tempo para se transformar.
Até o começo dos anos 80, a maioria das equipes ainda utilizava um único pivô e quatro jogadores abertos. Quando muito, tinham como ala-pivô um jogador de menor estatura, porém sem habilidades ofensivas, que servia como peça defensiva para pegar rebotes. Este foi durante muito tempo o conceito de ala-pivô, que trouxe notoriedade a diversos jogadores, desde mais expressivos como Dennis Rodman e Charles Barkley, a outros menos celebrados como A.C Green.
O fato é que até então, o ala-pivô era um jogador claramente menos habilidoso que o resto do time. Era visto apenas como um jogador sem tamanho para ser pivô e sem habilidade para jogar aberto, como ala. Era importante na defesa, nos rebotes e servia como catalisador da energia do time. Muitas vezes fazia o papel do enforcer, aquele atleta que entra na quadra para fazer o serviço sujo que facilita o jogo dos outros.
Esta primeira geração de alas-pivôs foi o modelo durante as primeiras décadas do basquete. Mas, como todas as outras posições, o ala-pivô também deveria evoluir. Este primeiro salto de qualidade pode ser identificado na figura de Karl Malone, expoente da segunda geração de alas-pivôs.
Malone era um jogador com arsenal ofensivo maior do que outros de sua posição. Durante duas décadas de NBA, ele ajudou a moldar o futuro da posição. Ele mostrou que um ala-pivô não só pode, como deve marcar pontos e ter maior papel ofensivo. Até então, as equipes escolhiam por focar seu modelo ofensivo no pivô dentro do garrafão. Malone mostrou que o ala-pivô era uma opção tão viável quanto. Isso fez com que se tornasse o segundo maior pontuador da história da liga, e junto com ele, uma revolução na posição.
No entanto, o que Malone não mudou foi o conceito de apenas uma força no garrafão, pois em seu auge sempre jogou ao lado de pivôs inexpressivos. Ele apenas mostrou que um ala-pivô poderia muito bem ser opção ofensiva viável, mas a coexistência com um pivô dominante era trabalho para a terceira geração.
A nova metamorfose do ala-pivô, assim como a segunda geração, pode ser ilustrada por um nome. Ou melhor, três nomes. Tim Duncan, Kevin Garnett e Dirk Nowitzki. Estes três jogadores ganharam títulos, prêmios de MVP e foram protagonistas nos últimos 15 anos de NBA. Os três estão, seguramente, entre os cinco melhores jogadores da posição na história do basquete. Duncan mostrou, ao lado de David Robinson, a viabilidade da coexistência de dois jogadores dominantes no garrafão. Garnett mostrou a necessidade de habilidades similares a de um ala em quesitos como controle de bola e poder de infiltração. Nowitzki, a seu turno, inaugurou uma tendência irreversível, que é a necessidade de um ala-pivô que converta arremessos de qualquer ponto da quadra.
E é a partir deste ponto que passamos a falar no surgimento da quarta geração da posição, desta vez com novo conceito, o stretch 4, expressão do inglês que representa o ala-pivô que joga mais aberto, com grande poder de arremesso, para ajudar no espaçamento.
O basquete moderno tornou-se mais dinâmico, se comparado ao passado. Todos os jogadores têm poder de infiltração. O porte físico dos atletas também aumentou consideravelmente, e as táticas defensivas estão cada vez mais amarradas. Com isso, para um esquema tático ofensivo dar certo no basquete de hoje, uma palavra é essencial: espaçamento.
O espaçamento é um conceito que diz respeito à habilidade do time de criar espaços na defesa, atraindo-a para fora do garrafão. Isso cria espaços para jogadas individuais e infiltrações. Sob este prisma, é primordial que o ala-pivô tenha não apenas a habilidade de pontuar de meia-distância como seus pares da segunda e terceira geração, mas também deve ser capaz de converter arremessos de três pontos com certa regularidade.
Este novo conceito fez até com que veteranos consagrados da posição tivessem que expandir seu arsenal para poderem se manter relevantes, a exemplo do espanhol Pau Gasol. Já conseguimos observar jogadores que são relevantes nessa posição com este traço desde o começo de suas carreiras, como Kevin Love, principal expoente deste novo modelo de ala-pivô.
Desde sua invenção, o basquete não viu uma posição se transformar tanto quanto a de ala-pivô. Hoje, é fundamental que o time tenha nesta posição um jogador versátil e engenhoso, que consiga se adaptar a diferentes defesas e que saiba explorar um variado arsenal ofensivo. Assim como no começo, alas infiltram, pivôs jogam embaixo da cesta e armadores articulam o jogo. Mas agora eles têm de mesclar outro elemento no jogo: um ala-pivô que sabe fazer um pouco de tudo que cada um deles faz, atuando muitas vezes como diferencial de sucesso de um time bem encaixado.