Reconstrução

Gustavo Freitas explica os motivos pelo qual o Boston Celtics não quer repetir o Chicago Bulls pós-Jordan

Fonte: Gustavo Freitas explica os motivos pelo qual o Boston Celtics não quer repetir o Chicago Bulls pós-Jordan

Toda vez que eu vejo a palavra reconstrução eu penso em duas coisas: a primeira é que o que estava sendo feito antes era tão bom, mas tão bom, que perderam muito tempo e não conseguiram manter o nível com mudanças aos poucos. A outra parte do princípio de que tudo era horrível, foram tentados alguns modos paliativos, e no fim, acharam melhor refazer a partir do zero. E na NBA não é nada diferente.

Na década de 90, o Chicago Bulls foi campeão em seis oportunidades. Nas três primeiras, a base era formada por Michael Jordan, Scottie Pippen, Horace Grant, Bill Cartwright, John Paxson, B.J. Armstrong, e claro, o técnico Phil Jackson. Só que nesse meio tempo, algumas coisas aconteceram.

Cartwright foi para o Seattle Supersonics, Grant para o Orlando Magic, Armstrong rumou para o Golden State Warriors, enquanto Paxson parou. Pippen e Jackson foram os únicos que permaneceram por lá, pois Jordan deu um tempo na NBA, foi se aventurar no beisebol (jogou no Sox errado), derrotou vilões, ajudou o Pernalonga, e por fim, retornou às quadras. Quando voltou, lá estavam Toni Kukoc, Ron Harper, Luc Longley, Steve Kerr, e os remanescentes Scottie e Phil. Jordan retornou com arremesso que não tinha. Sim, ele se aprimorou. Quem viu o camisa 23 até a sua primeira aposentadoria, sabe que ele era um jogador bastante explosivo, mas que não era exatamente o melhor arremessador. 

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Para 1995-96, a diretoria do Bulls fez um negócio da China. Mandou o esforçado Will Perdue para o San Antonio Spurs e recebeu um dos melhores defensores e reboteiros de todos os tempos, Dennis Rodman. Claro que Rodman, quando chegou, precisou de passar pelo crivo de Jordan, Pippen, e Jackson. Ainda, teve como babá o ala-pivô Jack Haley. Sério mesmo, um babá. Ele era quem segurava a onda do tatuado de cabelo multicolorido. Ficou só um ano por lá, e entrou em quadra apenas uma vez, na última partida daquele ano.

E não é que o Bulls teve outro tricampeonato? O recorde de vitórias em temporada regular pertence ao time de 95-96, com 72 triunfos em 82 embates. Superou o Sonics e o Utah Jazz. 

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O que aconteceu depois disso, todo mundo se lembra. 

Jordan parou outra vez. Pippen foi para o Houston Rockets. Rodman fingiu que jogou no Los Angeles Lakers e no Dallas Mavericks. Kerr se mandou, assim como Longley e Jackson. O Bulls ficou em uma situação que se postergava a cada ano, pois os contratos dos principais jogadores eram reassinados temporada após temporada. O time caiu vertiginosamente. 

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Tim Floyd foi escolhido para comandar a equipe, que ganhou 13 dos 50 jogos (ano de locaute) de 98-99. Pronto. Estava feito o início da reconstrução.

Pippen (32), Jordan (34 anos), Rodman (36), e Jackson, poderiam seguir por mais algum tempo? Sim, mas a ampulheta estava contra eles. Uma hora isso teria de acontecer. E se fosse saindo um a um, tornando essa mudança menos traumática?

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Bem, na teoria poderia funcionar, mas seria adiar o processo e o time não voltaria a vencer. Ao menos, tinha chances de não repetir os títulos.

Jordan já pensava em parar, mas a greve da NBA acabou acelerando sua vontade. Queria ser dirigente, o que acabou acontecendo anos depois. Pippen até poderia ficar, mas comandar uma reconstrução com um elenco fraco e um técnico bom na faculdade, mas inexperiente na NBA, não faria muito sentido. Quem iria mandar ali? Claro que a diretoria não queria isso. A ideia era mesmo implodir e recomeçar com Floyd controlando aquele grupo.

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Elton Brand e Metta World Peace, bem novinhos na época, chegaram para esse início de trabalho. Brand ficou só por duas temporadas. Tyson Chandler foi no ano seguinte, mas o time estava longe de ser bom, apesar de contar com nomes relativamente bons, como os veteranos Jalen Rose, Ron Mercer, e os jovens e promissores Jamal Crawford, Eddy Curry, e Brad Miller.

Somente em 2004-05, já com Scott Skiles no comando, é que o Bulls voltou a participar dos playoffs. Ou seja, seis anos depois do último título. A equipe de Chicago só virou um candidato ao campeonato somente em 2010-11, 13 temporadas após a Era Jordan.

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Esse tipo de reconstrução é muito demorado. Não adianta tentar tapar o sol com uma peneira. Não é todo dia que você dá a sorte de ter a primeira escolha no draft que tem Derrick Rose como a principal opção. E olha que o Bulls teve Brand e não conseguiu segurar.

O mesmo aconteceu com o Boston Celtics e é aí que está o ponto onde quero chegar.

Depois de vários anos lutando para ir aos playoffs, e com jogadores muito bons, mas com uma estrutura não tão convidativa, Danny Ainge resolveu apostar tudo para conseguir ao menos um título nos próximos cinco anos. Deu certo, mas precisou abrir mão de atletas com um enorme potencial, que ainda não estavam prontos. Um deles, Al Jefferson.

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Naquela temporada em que Kevin Garnett e Ray Allen chegaram, Ainge precisou mandar Jefferson para o Minnesota Timberwolves e ficou sem a escolha de primeira rodada, que foi para o Seattle Supersonics, transformada em Jeff Green. 

Teria talento se ficassem com os dois ao invés dos veteranos, com certeza. Mas não o suficiente para ser campeão logo de cara. Ainge é um cara de negócios e precisou trabalhar.

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Um título, um vice, e em todos os anos o Celtics foi para os playoffs como um time chato de ser batido, porém uma hora, assim como aconteceu com o Bulls, algo tinha de mudar. O efeito Garnett já não era mais o mesmo. Allen foi para o Miami Heat, enquanto Pierce e Rondo comandavam o grupo. O armador se machucou e o time se arrastou até o fim. E foi isso. Fim de uma era, até mesmo para Doc Rivers.

O que eu vou escrever talvez não agrade o torcedor do Celtics, mas é algo que penso cada vez mais. A diretoria, independentemente da posição do draft, vai trocar a escolha por um veterano com experiência em All-Star Game. Tenho a plena convicção de que isso será feito por vários motivos. 

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O primeiro é que o histórico nos mostra que desde 2001, o Celtics não fica com uma escolha top 10 em seu elenco. O último foi Joe Johnson, e só por um ano. Depois, o fato de ter dado certo o que Ainge fez no passado recente, fará com que isso se repita. O processo será exatamente o mesmo.

Por fim, não adianta que o Celtics não vai conseguir atrair grandes nomes na agência livre. Simplesmente porque o mercado é complicado. É desgraçadamente frio. O jogador da NBA está acostumado com mordomias, o que é justo. Quem é que vai querer se meter num lugar gelado como esse? Não tem como. É mais ou menos o que acontece com o New York Knicks, que apesar de estar um pouco mais para baixo, e ter um mercado melhor, tem uma torcida que pega no pé, a mídia está toda em cima, e não tem muito o que fazer.

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Então, o time de Boston terá de se virar com trocas e eu explico quais são os nomes em potencial e seus motivos:

Rajon Rondo: apesar de ser o capitão, o melhor jogador, ter jogado no All-Star Game, ser uma máquina de triplos duplos – especialmente quando seus jogos são transmitidos em cadeia nacional, Rondo é um babaca e não esconde isso de absolutamente ninguém. Recentemente, ele foi entrevistado e uma das perguntas foi se ele ficaria no Celtics se não recebesse o máximo permitido em seu novo contrato. A resposta? “Next question“. Simples assim.

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Como a diretoria o vê? Bem, ele tem uma boa relação com o técnico Brad Stevens e o GM Danny Ainge, mas que ficou bastante manchada após o incidente de Los Angeles, quando Rondo não quis acompanhar seus colegas para ficar na cidade e aproveitar o seu aniversário. Já comentei isso aqui e chegaram a dizer que eu estava exagerando. Mas o que mais você quer de seu principal jogador, a não ser lealdade, companheirismo, e liderança? Rondo não tem nenhum dos três. 

Ele queria imitar Ray Allen. Tentou chegar mais cedo aos treinos e aos jogos, arremessava, fazia tudo o que o veterano mandava. Desistiu. Não queria mais ser Allen. Então quis ser Kevin Garnett, um líder, um sujeito de muita energia, de poucas palavras com a imprensa, e intimidador. Também não deu certo. A temporada 2013-14 mostrou exatamente isso.

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Sei que ele voltou de uma cirurgia complicada, com vários problemas e um elenco ruim. Mas isso não explica, ao menos em tese, a sua falta de vontade com os seus colegas. Reclamou publicamente diversas vezes sobre problemas nos vestiários, chegou atrasado em outras tantas, questionou seus treinadores. No fim, é um cara péssimo de grupo. Não é essa a mensagem que a diretoria quer mandar aos seus jogadores.

O Celtics possui duas escolhas na primeira rodada e quer saber? Acho que não vai ficar com nenhuma delas. E quer saber ainda mais? Rondo estará junto de uma em troca por um astro.

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Jeff Green: ele foi escolha do Celtics naquele processo em que Allen chegou ao time. Jogou pelo Seattle, que depois mudou para Oklahoma City. Era a terceira opção ofensiva quando foi trocado de volta para o time de Massachusetts pelo pivô Kendrick Perkins. Teve todo aquele problema no coração, mas voltou a jogar e foi de fato o melhor atleta da equipe nesta temporada. 

Minha aposta é que ele será negociado ao lado da primeira escolha da equipe no próximo draft para que um jogador experiente e talentoso chegue. 

Jarred Sullinger: acredito piamente que ele é o Al Jefferson da vez. Com tantos jogadores de garrafão, e com a certeza de que o time buscará trocas para a posição de pivô, Sullinger será negociado por não ter altura suficiente para jogar lá dentro e, apesar de estar tentando expandir o seu jogo para o perímetro, ainda está cru.

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Avery Bradley: aqui é mais um chute do que qualquer outra coisa. Mas incluo Bradley porque ele tem mercado, assim como os outros e Danny Ainge quer essa reconstrução imediata. Bradley melhorou imensamente o arremesso de três, o que melhora ainda mais sua condição de apenas um exímio defensor.

Quem pode chegar

Existem nomes que estão sendo estudados por várias equipes, como Kevin Love. Mas a pergunta principal é: como fazer um garrafão com Kelly Olynyk e Love? Impossível. Seria a área pintada mais furada que um queijo suíço. Brandon Bass é baixo e é outro que pode sair. Kris Humphries sabe pegar rebotes, mas também é soft e não deve seguir no elenco por estar em seu último ano de contrato. 

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Recentemente eu ouvi um nome que nenhum torcedor vai gostar. Ou até vai, sei lá. Kevin Martin, também do Minnesota Timberwolves. A certeza que Rick Adelman não seguirá como treinador da equipe no ano que vem, faz de Martin um nome dispensável por lá. Vale lembrar que os dois trabalharam juntos no Sacramento Kings e no Houston Rockets.

Martin é um jogador de perímetro, com boa capacidade técnica. Seria uma válvula de escape com os tiros de longa distância, algo que certamente faltou ao Celtics em 2013-14 (20° em cestas de três convertidas e 27° em aproveitamento).

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A possibilidade de o pivô Omer Asik chegar é grande. Isso porque o Houston Rockets não precisa dele. É fato, nada além disso. Não é um astro, nem algo perto. Mas é uma troca que quase aconteceu em fevereiro. O Celtics enviaria Rondo e até Bradley por Asik e Patrick Beverley. O Rockets não quis – e agora projetando ainda mais o futuro, como não será campeão, vai procurar um negócio para lucrar. O Celtics quer se livrar de Rondo. O Rockets conta com Dwight Howard e James Harden. Seria um trio de respeito para a equipe texana e com certeza entraria no próximo ano como forte candidato. Todo mundo ganha. 

Por fim, o Celtics busca um armador para substituir Rondo. Pode ser Beverley, um sonho da diretoria. Entretanto, a ideia é ter mesmo um atleta com as mesmas características, e se possível, com um pouco mais de vocação no passe do que o próprio arremesso. Phil Pressey agradou quando jogou no lugar do camisa 9. Precisa de mais tempo de quadra para provar que pode um dia ser titular. Mas mais que isso, precisa de um novo contrato, pois o seu é expirante.

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Então, vamos resumir tudo isso.

O Celtics vai tentar de tudo depois da loteria do draft. Será muito agressivo para não passar o vexame desta temporada. Não quer repetir o que aconteceu, quando todos os três outros times da região (Boston Red Sox, no beisebol, New England Patriots, no futebol americano, e Boston Bruins, do hóquei) estão brigando por títulos. É uma questão, digamos, pessoal para Ainge.

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Não imaginem a equipe formando um elenco apenas competitivo para ir para os playoffs e ficar pelo caminho, como nos últimos anos. Querem ser campeões e se possível nas próximas temporadas.

A reconstrução não será como o Bulls fez, lenta e gradativa. Será para brigar pelo campeonato, ainda que envolva seus melhores jogadores em trocas.

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