Strugglesville bem que poderia ser o nome de uma série de TV, daquelas que aparecem na abertura os atores principais e, a partir daí, seus coadjuvantes em um cenário caótico tentando fazer um carro quebrado pegar na estrada, onde não tem sinal de telefone ou internet. Agora, troque os atores principais por LeBron James e Kevin Love. Depois, os coadjuvantes por Tyronn Lue, Isaiah Thomas, Dwyane Wade e Tristan Thompson. É o Cleveland Cavaliers de hoje.
Campeão da conferência Leste nas últimas três temporadas, o Cavs é esse carro quebrado, com o motor prestes a fundir. O time foi para uma cidade fantasma e não tem ninguém por perto para ajudar a voltar para Cleveland.
Mas essa situação do Cavaliers hoje não aconteceu da noite para o dia. Foi antes mesmo do início da atual temporada, quando a diretoria procurou meios de trocar Kyrie Irving, algo que até semanas atrás, ninguém sabia. Estavam todos (incluindo eu) criticando o armador por tentar deixar a equipe semanas após o início da agência livre, o que seria um absurdo. Só que Irving não tinha planos de sair.
Sem um dos principais jogadores, o Cavs foi obrigado a promover um rodízio na armação. Isaiah Thomas, um dos melhores atletas da temporada passada, chegou todo arrebentado e sem condições de jogo. Derrick Rose, outrora MVP, vivia um bom momento depois de tantos problemas físicos, seria o seu substituto. No entanto, ele se machucou mais uma vez, pensou em aposentadoria e no elenco só tinha o veterano Jose Calderon. LeBron chegou a assumir a condição, mas o time ficou capenga.
Sem Irving, o Cavaliers perdeu não só uma de suas maiores referências ofensivas, mas também um líder, um cara que estava acostumado com o esquema de jogo, com a cidade, com o ambiente. Você não substitui um sujeito desses de uma hora para a outra. Precisa de treinamento, precisa de tempo, de espaço. Thomas, Rose e, muito menos Calderon, tiveram isso. Os três vieram de outros times, com ritmos diferentes. Ou o espanhol esperava ser titular em algum jogo na temporada? Ninguém queria isso. Provavelmente, nem ele nessa altura do campeonato.
Imagine isso. Seu time perdeu Irving e, no fim das contas, não tinha ninguém. Todos sabiam que Rose seria uma solução de curto prazo, mas o que não se esperava era que fosse por tão pouco tempo. Quando Thomas finalmente estreou, foi obrigado a ter tempo de quadra sem estar nem perto de suas melhores condições.
E é normal um jogador do status de Thomas chegar perdido em uma nova equipe. E mais normal ainda é se ele estiver longe de seu melhor nível por conta de uma grave contusão. Agora, some tudo isso aí com o fato de que Kevin Love jogaria de pivô, com Jae Crowder e Wade (em declínio) chegando.
Nas oito primeiras partidas de 2017-18, o Cavs perdeu cinco, sendo quatro dessas derrotas por pelo menos 17 pontos. Estava claro que o time havia perdido a condição de melhor equipe do Leste. Depois, James abusou de sua condição técnica e conduziu o time a 18 vitórias em 19 jogos, dando a falsa impressão de que o Cavaliers estava de volta.
Aquele período imbatível do Cavs aconteceu quando o time superou apenas adversários mais fracos. Isso é fato. Mas a NBA vive de momentos. Se tivesse batido o Golden State Warriors naquele jogo de Natal, certamente estaríamos vendo o time na luta pelo primeiro lugar do Leste. Não é o caso. Desde aquela partida, são nove derrotas em 12 jogos disputados e agora, até o Miami Heat, quarto colocado, já o alcançou. Ambos possuem 27 triunfos, mas o Heat tem um revés a mais. E atenção: O Washington Wizards, o quinto, também está próximo. Strugglesville é, de fato, onde o Cavs está.
Lue cai nos próximos dias
O Cavs terá nove jogos difíceis até a parada para o Jogo das Estrelas, começando pelo San Antonio Spurs, fora de casa, na próxima terça-feira. Depois, tem Indiana Pacers, Detroit Pistons (duas vezes seguidas), Miami Heat em confronto direto, Houston Rockets. Todos esses seis na sequência. Nesse período, pega o Orlando Magic e o Atlanta Hawks longe de seus domínios, mas entre eles tem o emergente Minnesota Timberwolves. Por fim, ninguém menos que o Boston Celtics em Massachusetts e o mesmo Thunder, seu algoz do último sábado. Na teoria, dos 11 embates, dois são considerados menos complicados, mas são fora de Cleveland.
Lue não vai conseguir fazer esse Cavaliers voltar a vencer do jeito que está. O moral está no chão. LeBron já deu alguns pitis dentro de quadra e nos vestiários. A motivação foi derrubada. Por muito, mas muito menos, David Blatt foi demitido.
Mas quais seriam as opções no mercado de treinadores?
Aí é que está o problema. O Cavaliers não tem um técnico de ponta há mais de uma década. Mike Fratello e Lenny Wilkens foram os últimos considerados de primeira linha. E isso foi lá pelos anos 90. Desde que LeBron foi selecionado no draft, passaram por lá nomes como Paul Silas, Brendan Malone, Mark Brown, Byron Scott, além de Blatt e Lue. Hoje, o que tem de melhor por aí é David Fizdale, demitido pelo Memphis Grizzlies em novembro. Vale lembrar que, quando isso ocorreu, LeBron e Wade criticaram a diretoria do Grizzlies por tal decisão.
I need some answers. Feels like my man was a fall guy
— LeBron James (@KingJames) November 27, 2017
I need answers!!! WTF https://t.co/z39oNRQok0
— DWade (@DwyaneWade) November 27, 2017
O discurso oficial hoje é de que Lue será mantido e que o time precisa reagir. Sim, disso, até a Maria Clara, minha filha de dois anos, sabe. Mas é óbvio que lá nos bastidores, os jogadores já não suportam mais perder. Não estamos falando de um grupo de atletas acostumados com derrotas. São caras que acabaram de ser campeões do Leste pela terceira vez seguida. Vá lá. Desde o primeiro título dessa sequência, sobraram apenas J.R. Smith, Iman Shumpert, Tristan Thompson, Love e LeBron. Mas Kyle Korver, Jeff Green, Rose e Wade foram para os playoffs em quase todos os anos. Portanto, são jogadores vencedores. O problema é que só isso não basta. Eles precisam de alguém com capacidade de mudar o time sem perder performance, sem depender exclusivamente de lampejos de James.
Existem muitos buracos no elenco. Não tem um pivô de ofício, além de Ante Zizic, que fez 12 partidas até aqui. Thompson é razoável na defesa e cumpre seu papel nos rebote ofensivos, mas só. Love sempre vai bem no ataque, mas entrega a paçoca do outro lado. Aliás, quem se importa com defesa nessa liga, não é mesmo? Levar 148 pontos em um jogo sem prorrogação é super normal.
Opções no mercado
Vamos lá. Nos últimos dias, George Hill, Lou Williams e DeAndre Jordan foram especulados. Mas quem o Cavs poderia ceder por qualquer um deles? Thompson pode até ser, mas seu salário (US$16.4 milhões, além de mais dois anos) não ajuda. Channing Frye é atrativo por conta de seu expirante de US$7.4 milhões e só. Quem vai querer Shumpert (tem opção em seu contrato até a próxima temporada) ou Smith (até 2019-20)?
Mesmo que Hill e Jordan pintem em Cleveland, o time seria competitivo o suficiente para ir até onde? Playoffs, ok. Final de conferência, pode até ser. Mas não é páreo para os melhores do Oeste.
É difícil imaginar algo para esta temporada, algo imediato. Não é impossível porque LeBron está lá.